Jogo auxilia processo de alfabetização no ensino fundamental

Com o desafio de amenizar os impactos da pandemia, educadores desenvolveram jogo que auxilia a aprendizagem no processo de alfabetização

A inclusão escolar tem sido um dos grandes temas discutidos na atualidade. Esse fato pode ser observado a partir de um breve recorte histórico da legislação educacional brasileira. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, de 2008, e outras leis e políticas públicas vem assegurando, paulatinamente, o acesso dos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e/ ou com altas habilidades/ superdotação nas escolas comuns. O seu principal objetivo é tornar a educação mais inclusiva e acessível a todos, respeitando as diferenças, particularidades e especificidades de cada indivíduo.  

Foi pensando nessa perspectiva que a Secretaria da Educação Municipal (SME) de Rio Claro (SP) se inscreveu na seleção nacional do curso formativo do Instituto Rodrigo Mendes (IRM). Nós, da Escola Municipal Celeste Calil, tivemos a oportunidade de participar da formação Materiais Pedagógicos Acessíveis em 2022. 

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A nossa escola

Nossa unidade fica localizada no bairro Jardim Novo Wenzel, com uma parte dos habitantes em situação de vulnerabilidade social. Temos cerca de 340 estudantes matriculados, os quais atendemos nos anos iniciais do ensino fundamental. Desse total, há nove crianças público-alvo da educação especial, sendo seis crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), duas com deficiência física e uma com deficiência auditiva. 

Todas as crianças com deficiência são acompanhadas por educadores do Atendimento Educacional Especializado (AEE) no contraturno das aulas regulares, na sala de recursos. 

A nossa comunidade escolar é composta por diferentes costumes e culturas, visto que é formada por pessoas oriundas de vários estados, como Paraná, Bahia, Pernambuco, Ceará, Alagoas, Rio de Janeiro e, principalmente, Minas Gerais.  

As características da população local têm mudado muito com o decorrer dos anos. No passado, a maioria dos responsáveis dos educandos exercia seu ofício nas lavouras. Na atualidade, os empregos foram ampliados para os setores da indústria, construção civil e comércios da cidade. Contudo, ao analisar o projeto político-pedagógico (PPP) da unidade escolar, se observa que uma parcela das pessoas se encontra desempregada ou em trabalhos informais. 

Identificando desafios

Durante a nossa formação foram vários encontros que possibilitaram saberes, reflexões, aprendizados e ações. Essas reuniões trouxeram conhecimento e trocas de experiências de educadores e gestores de outras redes de ensino, o que mostrou que as situações desafiadoras vivenciadas em nossa escola também são realidade em outros locais. 

Um dos desafios que enfrentávamos naquele momento era o impacto da pandemia de covid-19, por nossas crianças terem ficado mais de um ano longe da sala de aula e a aprendizagem precisar ser retomada, principalmente na fase de alfabetização. 

A partir da formação e desse desafio, os educadores Márcia Lupozelli Galli, professora de sala regular do segundo ano, Janete Costa da Silva Maia, professora do AEE, e Roberto Jefferson Thomé, professor coordenador, começaram a desenvolver o material pedagógico acessível “Baloo”. O objetivo principal do projeto foi estimular a aprendizagem dos estudantes do 2º A, por meio de jogos de alfabetização interdisciplinar. 

A construção do jogo aprofundou os momentos de conversas e reflexões entre os participantes acerca das diversas habilidades esperadas para os estudantes da turma. Pensou-se, nesse contexto, de que forma inserir a tecnologia para auxiliar a participação de todos, promovendo o desenvolvimento da sociabilidade da criança e o estreitamento da parceria entre escola e família 

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A construção do jogo Baloo

O caminho percorrido para a elaboração do jogo passou por várias etapas. A primeira delas foi a chuva de ideias que os educadores tiveram, a fim de eliminar as barreiras observadas na unidade educacional, como, por exemplo, a falta de cobertura na quadra para as práticas de atividades físicas em dias chuvosos/ensolarados ou a falta de uma lousa digital em que as crianças pudessem, de maneira lúdica, explorar o universo tecnológico. 

Ambos os projetos não foram viáveis. No entanto, essas ideias nos ajudaram a reorganizar e repensar algumas situações do cotidiano escolar. Nessas discussões surgiu a lembrança de uma brincadeira de perguntas e respostas sobre os conteúdos curriculares, organizada pelos docentes na semana da criança. 

Daí surgiu a ideia do jogo Baloo, onde se relacionou quatro áreas de conhecimento (matemática, língua portuguesa, ciências naturais e sociais) com propostas de acessibilidade a todos, seguindo o Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA), possibilitando assimilar novos aprendizados. 

Após a concepção do jogo, chegou a hora de elaborar o visual do material. A primeira etapa foi desenvolver o tabuleiro, para isso, contamos com a colaboração da professora de arte Eliana Roberta Rossi Vallongo e de um membro da comunidade escolar, o senhor José Maia.  

O nome foi pensado logo em seguida, a partir do filme do “Mogli: o menino lobo”. Nessa história há um urso chamado Baloo, que ensina a criança como viver na floresta, e foi nessa perspectiva, de ensinar, que o nome do protótipo surgiu.  

Montagem do Baloo

Utilizamos MDF para a confecção do tabuleiro e de uma caixa. Dentro da caixa há equipamentos eletrônicos, placas e cartões de memória, configurados para a contagem da pontuação de acertos das perguntas de cada equipe; tempo para o acionamento do botão via controle remoto para verificar quem acionou primeiro; um botão para a escolha das perguntas; e fichas de resposta contendo as perguntas elaboradas.  

Na etapa de montagem, contamos com a colaboração dos formadores, pessoas com conhecimento em tecnologia e dos demais educadores de nossa escola. 

Imagem do protótipo do material pedagógico acessível “Baloo” e os acessórios complementares. No desenho há o tabuleiro, onde cada lado representa quatro áreas de conhecimento: ciências naturais, na cor verde, Português, na cor amarela, ciências sociais, na cor vermelha, e matemática, na cor azul. Em dois lados da borda do tabuleiro, há um placar zerado. Na folha há também o desenho dos botões que acionam as perguntas de cada área de conhecimento e dos demais componentes tecnológicos do jogo. Fim da descrição.
Foto: Roberto Jefferson Thomé. Fonte: arquivo pessoal.

Em suma, esse jogo consiste em um tabuleiro, representando as quatro áreas do conhecimento, com dois controles remotos, uma caixa com acionador contendo placar, um botão sonoro para determinar qual jogador responderá à pergunta (vermelho), um botão que sorteia as perguntas (verde) e cem cards plastificados com as perguntas para serem usados como segunda opção para estudantes com deficiência auditiva.  

O desdobramento do projeto

Esse trabalho possibilitou conhecer e aprofundar algumas competências e habilidades da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), esperada para o segundo ano escolar. Foi a partir dessa reflexão inicial, associado aos anseios das crianças, que os educadores elaboraram as fichas de perguntas com vinte e cinco questões para cada área do conhecimento. Para esse trabalho foram elencados alguns objetivos específicos, tais como: 

  • Possibilitar o reconhecimento da importância da ciência no campo investigativo a fim de promover o desenvolvimento da criatividade; 
  • Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora e escrita), corporal, visual, sonora e digital, bem como conhecimentos das linguagens artísticas, matemáticas e científicas; 
  • Expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos; 
  • Compreender e utilizar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais, incluindo as escolares, para se comunicar, acessar e disseminar informações;  
  • Produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autonomia na vida pessoal e coletiva; 
  • Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação. 

Para que os estudantes fossem protagonistas do conhecimento, eles foram convidados a participar de algumas etapas de elaboração do “Baloo”. Eles contribuíram, por exemplo, com a gravação das perguntas sonorizadas aos jogadores. 

Percebemos como resultado dessa ação uma grande oferta de novas palavras, possibilitando aos educandos uma ampliação do vocabulário nas diversas áreas do conhecimento, além da introdução de alguns conceitos já trabalhados ou que ainda serão apresentados no decorrer do ano letivo. 

O projeto foi ganhando contornos finais, com um grande trabalho colaborativo. Os professores e os estudantes participaram juntos da criação, discussão, desenvolvimento e conclusão do projeto demonstrando os resultados finais para seus familiares.  

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Divertimento e aprendizagem 

O material pedagógico acessível possibilitou, juntamente com o aprendizado do Desenho Universal de Aprendizagem (DUA) e da BNCC, ampliarmos a nossa concepção em relação à singularidade de cada indivíduo e isso contribuiu para o aprendizado das crianças e dos educadores.  

Ficou perceptível, durante o desenvolvimento do projeto, a importância de identificar e refletir sobre as barreiras enfrentadas pela turma e sobre a relevância da questão inicial para superar tal desafio.  

São essas indagações que nos provocam e possibilitam pensar nas múltiplas formas de representação do conhecimento ou de informação que se pretende compartilhar durante o processo de ensino-aprendizagem. Também nos provocam a pensar em como esses envolvimentos agregam na consciência coletiva, minimizando os preconceitos vivenciados pelos indivíduos e permitindo, assim, a todos a plena participação e oportunidade.  

Outro ponto observável se refere às conquistas que o projeto proporcionou às alunas e alunos. Foram ações benéficas que contribuíram para o desenvolvimento do educando, tais como: atenção, compreensão, processamento de informação e memória seletiva.  

Nesse sentido, verificamos que o envolvimento dos estudantes no projeto foi muito satisfatório, com muita atenção e animação, pois eles conseguiram interagir uns com os outros com muita autonomia.  

Esse tipo de proposta melhora o nosso relacionamento no ambiente escolar e a nossa relação com o outro tende a ser melhor. Juntos somos capazes de construirmos uma educação mais inclusiva e de qualidade em que todos podem ter acesso.  

Os conhecimentos construídos a partir desse espaço formativo proporcionaram novos horizontes para ampliar e desenvolver outros projetos, a fim de implementar uma rotina de trabalho em nossa unidade escolar. Para isso, o envolvimento dos estudantes, familiares e demais membros da comunidade escolar foi muito significativo, uma vez que todos demonstraram interesse em participar, dando sua contribuição para o desenvolvimento do projeto. 

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Este relato de experiência é fruto da participação das autoras na edição 2022 do Materiais Pedagógicos Acessíveis – formação em serviço para educadores envolvidos no processo de escolarização de estudantes público-alvo da educação especial em escolas comuns.   

A edição de 2022 do projeto foi realizada pelo Instituto Rodrigo Mendes e o MudaLab, com parceria do Instituto Ambikira e Instituto Far, com objetivo de contribuir na construção de materiais pedagógicos acessíveis que auxiliem o processo de ensino-aprendizagem de estudantes com e sem deficiência.  

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