Confira os temas e acontecimentos que marcaram 2024
Desafios do AEE, diferença entre PEI e PAEE, capacitismo e exemplos de práticas inclusivas: foram muitos os destaques do ano selecionados para a retrospectiva do DIVERSA
Do compartilhamento de práticas e projetos inclusivos em diferentes escolas até sugestões de como os candidatos às eleições de 2024 poderiam priorizar ações em prol da educação inclusiva. Do detalhamento de como funciona o atendimento educacional especializado (AEE) até o debate sobre como decidir se o estudante precisa ou não de um profissional de apoio escolar. De orientações sobre como enfrentar o capacitismo até a apresentação das questões discutidas na Conferência Nacional de Educação (Conae), realizada no segundo trimestre. Foram muitos os assuntos que marcaram o ano no DIVERSA.
São histórias e informações que se mantêm relevantes e merecem uma (re)leitura, pois podem contribuir para fortalecer as discussões e reflexões em prol da construção de uma educação inclusiva. Para guiar a caminhada por entre os principais temas e acontecimentos que foram destaque na plataforma DIVERSA em 2024, preparamos uma retrospectiva. Confira!
Por dentro da educação especial
Modalidade criada para complementar o atendimento a estudantes com deficiência, transtorno do espectro do autismo (TEA) e superdotação ou altas habilidades em escolas inclusivas, a educação especial envolve vários profissionais, recursos, legislação e documentos específicos. Um dos principais é o professor do atendimento educacional especializado (AEE), instituído pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI), de 2008. O DIVERSA produziu conteúdos para responder às principais dúvidas a respeito da atuação, da formação necessária e dos limites da atribuição do AEE, bem como para explicar os modelos mais utilizados e os principais desafios da oferta desse serviço no país. E também entrevistou Nathalia Meneghine, que atua como professora do AEE e professora regente em uma escola mineira. Ela defende a presença do AEE em todas as escolas e comenta suas estratégias para equilibrar a rotina nas duas posições e colocar em prática uma educação inclusiva.
Em relação ao profissional de apoio escolar, a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), de 2015, garante sua presença nas escolas para auxiliar, quando necessário, os estudantes com deficiência nas “atividades de alimentação, higiene, comunicação e locomoção”. Mas quem avalia e define essa necessidade? O debate está posto e foi intenso neste ano.
Outra importante informação é que toda escola com estudantes público-alvo da educação especial pode pleitear a instalação de uma sala de recursos multifuncionais (SRM), espaço onde o AEE deve ser prioritariamente realizado. Nesta reportagem, é possível saber mais sobre SRM e entender como fazer a requisição.
O trabalho na escola também envolve a preparação de um instrumento orientador do planejamento. A legislação brasileira trata do plano de AEE, mas há redes e instituições de ensino que adotam documentos como o Plano Educacional Individualizado ou Plano de Ensino Individualizado (PEI) ou o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI). Qual a diferença entre eles? Para explicar, o DIVERSA se dedicou a buscar informações e conversar com especialistas e educadores.
Trabalho colaborativo em prol de todos
O ditado popular que diz ser preciso uma aldeia para criar uma criança também vale nas escolas. Todo profissional presente na comunidade escolar é importante para colocar em prática uma educação inclusiva, cada um com sua responsabilidade e sempre em diálogo com os demais.
Para entender como essa engrenagem pode funcionar, discutimos a necessidade de articulação, capitaneada pela coordenação pedagógica e que envolve os professores regentes e do AEE. E também de se organizar um calendário de formações para preparar os educadores e promover reflexões a respeito da prática pedagógica.
Outro elemento fundamental nessa comunidade são as famílias. O Instituto Rodrigo Mendes (IRM), organização mantenedora do DIVERSA, produziu um guia especial com orientações para apoiar mães, pais, familiares e responsáveis por crianças e adolescentes com deficiência na garantia do direito que todos têm de estudar, se desenvolver, explorar seu potencial e conquistar autonomia, além de frequentar a escola como qualquer pessoa, sem discriminação ou segregação.
A publicação foi a primeira ação da nova frente de atuação do IRM, voltada a famílias de pessoas com deficiência, e marcou os 30 anos do instituto. Paralelamente, em outubro, a Globo, em parceria com o IRM, UNESCO e UNICEF, lançou uma campanha inédita, protagonizada pela atriz e apresentadora Benedita Casé Zerbini e o cineasta e apresentador Pedro Henrique França. O filme discute a importância da informação como ferramenta de inclusão.
O DIVERSA, por sua vez, detalhou o trabalho de uma escola em Ilhabela (SP) que apostou na parceria escola-família para promover a inclusão. Além disso, apresentou depoimentos de diversas mães, como Juliana Amaro e Waldilaine Melo, que relataram os desafios e estratégias que utilizam para garantir a educação dos filhos com deficiência em escolas comuns no Brasil ou na Itália, caso de Valéria Villas Boas Ucelli. Também relataram suas experiências mães que uniram a criação dos filhos com lutas coletivas, como Keila Leite Chaves, que criou o Centro de Apoio a Mães e Pais de Portadores de Eficiência (Campe), e Maria Antônia Goulart, fundadora do Movimento Down.
Práticas inspiradoras espalhadas pelo país
Nas salas de aula e nos demais espaços da escola, muitos educadores se dedicaram a planejar estratégias diversas e elaborar projetos com o objetivo de efetivar a inclusão.
De Vitória (ES), temos a professora Priscila Castro dos Santos, que produziu mini-histórias para narrar o cotidiano de suas turmas e, assim, comunicar aos outros educadores e às famílias os diferentes percursos e ritmos de aprendizagens de cada criança. O projeto foi um dos vencedores do Prêmio Educador Nota 10, iniciativa do Instituto Somos e da Fundação Victor Civita, com o apoio do IRM.
As professoras Vanessa Dias da Silva e Zely Ferreira da Rocha mostraram a potência existente na diversidade ao promoverem o encontro entre as culturas da infância e o conhecimento sobre os povos indígenas, por meio de um intercâmbio de brincadeiras entre crianças de escolas em São Paulo (SP) e em Ilhéus (BA).
Em outra escola de São Paulo, a professora Marina Basques, que atua no AEE, utilizou o horário das refeições para ampliar a aprendizagem das crianças com um cardápio inclusivo. Ao apresentar alimentos por meio de imagens, textos e Libras, ela ensina que há diferentes formas de comunicação e estimula reflexões sobre inclusão.
Para colaborar no processo de pensar práticas pedagógicas inclusivas, o IRM promoveu, no ano passado, uma formação semipresencial com educadores das cinco regiões do país por meio do projeto Alavancas para a Educação Inclusiva de Qualidade, iniciativa do IRM, em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Movimento Bem Maior, o Instituto Ambikira e o Instituto Machado Meyer.
Como resultado, vários projetos foram realizados em diferentes instituições de ensino. Em Patos de Minas (MG), uma escola criou um ambiente com brincadeiras sensoriais, no qual a diversidade de materiais e objetos permite às crianças explorar os cinco sentidos em atividades que as ajudam a compreender melhor o próprio corpo e suas capacidades e a desenvolver sua percepção de mundo. Os jogos matemáticos estão no centro da proposta de outra escola da mesma cidade, em atividades que permitiram envolver todos os estudantes de uma turma de 9º ano.
A matemática também esteve presente no projeto de uma escola de Campo Formoso (BA), que colocou as crianças do 3º ano para comprar, vender e trocar figurinhas, o que permitiu avanços na aprendizagem e na interação entre todos os estudantes.
Em Maués (AM), o foco foi a valorização da cultura indígena, com um projeto que trabalhou leitura, escrita e oralidade nos anos finais do ensino fundamental usando lendas e histórias locais. Já o interesse natural das crianças dos anos iniciais do ensino fundamental por animais serviu de base para a proposta de uma escola em Lucas do Rio Verde (MT), que criou uma série de atividades para estimular o desenvolvimento da habilidade de pesquisar, competência essencial para que os estudantes aprendam com autonomia.
Em entrevista ao DIVERSA, o cientista político Fernando Luiz Abrucio, que atualmente coordena uma pesquisa de avaliação de impacto do projeto Alavancas para a Educação Inclusiva de Qualidade, defendeu a necessidade de enfrentar a desigualdade territorial como essencial para o avanço da educação inclusiva, além da criação de um forte movimento para colocar no debate nacional a construção de uma governança cooperativa entre os governos federal, estaduais e municipais.
Desafios e estratégias possíveis
Uma das primeiras barreiras para a inclusão são as atitudinais, que podem resultar em ações capacitistas, ou seja, em preconceito em relação às pessoas com deficiência. Publicamos, neste ano, uma reportagem que explica o que é capacitismo e traz orientações de como a escola pode enfrentá-lo.
O desafio de superar o modelo médico da deficiência e o protagonismo das mulheres na construção do modelo social da deficiência foi tema de uma conversa com Karla Luiz, psicóloga e pesquisadora. Nesta entrevista, a especialista conta como os movimentos feministas contribuíram para a compreensão do que é ética do cuidado e para que as pessoas com deficiência fossem vistas para além de suas especificidades.
Também preparamos um texto para tratar das barreiras que podem surgir durante a alfabetização, período essencial na trajetória escolar de todo estudante. E apresentamos o debate proposto pela especialista Maria da Paz de Castro, a Gunga, ao convidar os educadores para conhecerem os estudantes com deficiência antes de receberem qualquer laudo médico e fazerem da interação professor-aluno a principal fonte de informação a respeito da singularidade de cada um.
Em geral, um dos caminhos possíveis para enfrentar as barreiras é a utilização do Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA) na hora de planejar as aulas e atividades em sala. Isso porque essa estratégia parte da premissa de que, para ampliar as oportunidades de desenvolvimento de cada estudante, é essencial diversificar a maneira como os conteúdos são apresentados, como os alunos podem expressar o que aprenderam e como se engajam nas atividades. Em uma série de reportagens, explicamos mais o que é esse conceito, apresentamos uma entrevista com o professor e pesquisador espanhol Eladio Sebastián-Heredero, especialista no tema, e detalhamos uma proposta de sequência didática em língua portuguesa, elaborada por Rosana Kelly Baldan, que pode inspirar o planejamento para outros componentes curriculares.
Políticas e serviços públicos
Para além do trabalho nas escolas, o fortalecimento da educação inclusiva depende de políticas públicas. Em janeiro, apresentamos as expectativas sobre como o Ministério da Educação (MEC) iria realizar as ações para colocar em prática as metas previstas no plano lançado no final de 2023 para avançar com a PNEEPEI, como a articulação entre municípios, estados e escolas.
Também publicamos texto analisando os principais pontos discutidos na Conferência Nacional de Educação (Conae), que servirão de base para o projeto de lei do novo Plano Nacional de Educação (PNE). E debatemos se as mudanças no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), como o aumento do valor pago pelas matrículas dos estudantes público-alvo da educação especial, irão ampliar os recursos para a educação especial.
Como para elaborar políticas públicas é fundamental o acesso a dados, a divulgação dos resultados do Censo Escolar de 2023 foi destaque no DIVERSA. Os números, que mostram, por exemplo, a manutenção do crescimento das matrículas de estudantes público-alvo da educação especial em escolas comuns, foram atualizados no Painel de Indicadores da Educação Especial, organizado e mantido pelo IRM e disponibilizado em nossa plataforma.
Para as famílias, explicamos o que é o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e quem pode acessá-lo e revelamos com exclusividade que os dados de 2022 e 2023 do BPC na Escola ainda precisam ser atualizados pelo MEC. Também conversamos com a defensora pública Renata Tibyriça, que explicou quem tem direito à assistência jurídica gratuita e deu exemplos de como o órgão paulista atua para promover a inclusão escolar.
Ano eleitoral e tragédia no RS
2024 foi também marcado por dois acontecimentos, um que estava no calendário e outro que pegou inúmeras famílias, estudantes e educadores de maneira imprevista e mudou a vida escolar de todos eles.
As eleições municipais já estavam no radar, por isso, a Agenda 227, composta por 452 organizações, entre as quais o IRM, lançou um documento com diretrizes para orientar políticas públicas municipais comprometidas com a efetivação de direitos de crianças e adolescentes. Em outro texto, especialistas explicaram o papel de vereadores e prefeitos e orientaram como escolher candidatos comprometidos com uma educação inclusiva.
As enchentes no Rio Grande do Sul, por sua vez, deixaram um rastro de destruição, afetando centenas de escolas e paralisando o ano letivo de milhares de estudantes. Tratamos dos desafios da retomada gradual das aulas em uma escola de Eldorado do Sul e outra em Canoas, além de convidar dois pesquisadores para debater as consequências desse tipo de tragédia para o clima escolar e apontar sugestões de próximos passos, como a possibilidade de (re)construir um ambiente acolhedor e inclusivo, com revisão do projeto político-pedagógico (PPP) e elaboração de um plano de convivência anticapacitista, considerando as necessidades de grupos vulnerabilizados.
Para fechar o ano, publicamos uma reportagem que explica a diferença entre inclusão, integração, segregação e exclusão de pessoas com deficiência. Os especialistas e ativistas entrevistados comentam por que é importante conhecer os quatro paradigmas históricos e sugerem estratégias para efetivar a inclusão nas escolas.
Os textos selecionados para esta retrospectiva exemplificam e reforçam nosso compromisso em oferecer conteúdos que contribuam com informações, reflexões e exemplos práticos para a luta por uma educação de qualidade para todos. Muito obrigado por nos acompanharem neste ano. Seguimos juntos em 2025!