Um panorama da educação especial no ensino médio

Especialista do IRM contextualiza o atual cenário da educação especial nos anos finais da educação básica e desafios do Novo Ensino Médio

Estudos realizados nas últimas décadas apontam que o ensino médio tem sido a etapa da educação básica com as maiores taxas de evasão, defasagem de aprendizagem e currículo rígido. Isso tinha implicações diretas com a educação especial, dadas as condições de permanência que esse grupo enfrenta para concluir sua trajetória escolar.  

Com a implementação do Novo Ensino Médio, escolas e estudantes se depararam com duas grandes mudanças: o aumento da carga horária e uma flexibilização curricular, com disciplinas obrigatórias e outras eletivas que ficam à critério da escolha dos jovens. 

A pergunta que fica é: quais desafios a antiga estrutura está deixando para a atual em relação aos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e superdotação/ altas habilidades? 

Atual cenário dos anos finais da educação básica

Os microdados do Censo Escolar disponíveis até 2020 nos permitem enxergar três grandes desafios no ensino e aprendizagem de estudantes com deficiência: a formação continuada de professores, a oferta de Atendimento Educacional Especializado (AEE) e a distorção idade-série.  

De acordo com o Censo Escolar, em 2020, a maior parte dos educadores regentes do ensino médio (97,5%) não tinha formação continuada sobre educação especial. Esses mesmos docentes lecionam em classes comuns, ou seja, para todos, independentemente de especificidades. Nesse sentido, a falta de formação implica em barreiras atitudinais, comunicacionais e metodológicas no atendimento de jovens com deficiência.  

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O retrato do AEE mostrava que as taxas de matrículas no ensino médio foram reduzidas de 27,5% para 23,6%, de 2017 a 2020. Isso pode refletir uma das hipóteses: a redução da oferta ou a redução da demanda. Vale lembrar que a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) estabelece que o AEE deve ser complementar (ou suplementar), nunca substitutivo à escolarização e sempre articulado com a proposta pedagógica desenvolvida na classe comum. Além disso, o oferecimento é obrigatório e deve ser realizado no turno inverso ao das aulas. Nos anos finais da educação básica, a complexidade dos conteúdos exige um atendimento dedicado e atraente para garantir a permanência do aluno.  

Por fim, a distorção idade-série apresentou taxa de 50%, no mesmo ano. Em vez dos adolescentes público-alvo da educação especial estudarem com jovens da mesma idade, metade estava em turmas de pelo menos dois anos a menos, situação que pode tornar a aprendizagem pouco desafiadora.  

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Desafios para o novo ensino médio

Mesmo frente a esse cenário com pouco investimento na formação de educadores, é possível ver uma chama de esperança ao olhar para o envolvimento das famílias. O que se observa é o crescimento do número de matrículas de jovens com deficiência no ensino médio em classes comuns. Dados do Censo Escolar de 2022 apontam para mais de 200 mil, o que representa um crescimento de 35% em comparação a 2020, quando eram 148 mil estudantes matriculados. Ou seja, um público que deseja trilhar um caminho de construção de conhecimento e oportunidades.  

Para que as mudanças propostas no Novo Ensino Médio assegurem a permanência de jovens com deficiência nas escolas, é fundamental investir em melhorias constantes na formação de educadores e gestores, para impulsionar um planejamento pedagógico inclusivo que respeite as singularidades de cada estudante. Também é preciso ampliar a formação de professores de AEE com perfil multifuncional, que trabalhem de maneira colaborativa com os docentes regentes na elaboração de estratégias diversificadas de ensino e na remoção de barreiras, no aumento da variedade de materiais e recursos didáticos, bem como nas formas de avaliação.  

Temos a responsabilidade de colaborar para que os sistemas de ensino adotem práticas inclusivas, abracem a diversidade e deem condições de aprendizado para que todo estudantes desenvolva o máximo do seu potencial e seja protagonista da própria história. 

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Este artigo foi publicado originalmente no Observatório da implementação da BNCC e do Novo Ensino Médio, em 31/03/2023, e está disponível para leitura em http://bit.ly/3GlYBiq. 

Karolyne Ferreira é analista de advocacy do Instituto Rodrigo Mendes. Bacharel e licenciada em Geografia e mestre em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP). 

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