Com o trabalho que leva o mesmo nome de um importante movimento negro nos EUA, educadora deu início a uma série de atividades para valorização étnico-racial
Nosso projeto se deu início em plena pandemia, em outubro de 2020, com alunos do 9º ano do ensino fundamental do Centro De Ensino Lúcia Chaves, em São Luís (MA), e veio com a intenção de abordar uma temática étnico-racial alinhada aos conteúdos curriculares da língua inglesa.
Vi a necessidade de trabalhar algo que os fizessem permanecer participando das aulas mesmo que de forma remota já que a evasão escolar se intensificava.
Nosso estado tem 74% da população constituinte que se autodeclara negra, e não é mais aceitável que o próprio racismo não seja abordado nas aulas e assim trabalhar para uma escola antirracista.
Trabalho em prática
Nosso material foi todo racializado, com biografias de ativistas (Martin Luther king, Mandela, Zumbi dos Palmares…) e músicas referentes à África, autoestima negra, movimento “Black Lives Matter”. Embora tenhamos utilizado atividades diferenciadas, sempre levamos ao estudo das quatro habilidades que a língua exige: listening, writing, speaking e reading (ouvir, escrever, falar e ler).
Fizemos visita a museu, sessão de fotos e criação de uma biblioteca temática a partir de doação por parte de um defensor público do Estado. Temos em nossos acervos obras como “Quarto de despejo”, “Racismo recreativo”, “Racismo estrutural”, “Eu, empregada doméstica”, “Um defeito de cor”, “Manual antirracista”, entre outros livros que contribuem para a construção do discurso argumentativo necessário.
A fim de aproximar grupos diferenciados da escola na construção de um ambiente antirracista, o projeto “Black Lives Matter” realizou algumas ações, tais como palestras com representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Juiz de direito, sociólogo e psicólogo.
Como sempre prezamos pela produção científica por parte dos estudantes, pensamos na produção para expansão do conhecimento e o protagonismo exercido por quem sempre deveria ser o centro de uma educação equitativa.
Podemos citar a confecção de jogos de tabuleiro abordando o racismo, poemas, coleta de relatos, produção de uma revista em quadrinho sobre super herói negro, ensaio fotográfico enaltecendo a beleza negra e um dicionário temático bilíngue.
Todo o material produzido foi levado pelos estudantes para que as famílias participassem dessa discussão, principalmente os jogos de tabuleiro. As palestras também foram direcionadas às famílias que participaram de forma ativa, nos auxiliando nos depoimentos coletados.
Conseguimos, dessa forma, avançar nos conteúdos curriculares, mas todos com abordagem diferenciada, onde nossas alunas e alunos perceberam que aqueles momentos eram o início de um pertencimento nunca vivenciado por eles, e a escola é isso: lugar de referência, construção e desenvolvimento, mas que, se eles não se verem representados, eles não sentirão o desejo de participar desse processo.
Todas as abordagens eram feitas na língua inglesa, até mesmo as questões de interpretação eram com texto em inglês. Trabalhamos com muitos pensamentos e frases de ativistas, trechos de músicas referentes ao combate ao racismo e formação de diálogos.
A cada semana tínhamos atividades diferenciadas, algo que os motivassem a discutir, refletir e produzir. Dessa forma, nosso projeto foi ganhando grande repercussão na cidade, já que foi o primeiro projeto bilíngue antirracista dessa natureza.
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Além dos muros da escola
Fomos convidados pelo Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ-MA) para expor o projeto, mostrando a produção científica de uma população periférica, negra e de escola pública, o que nos deu grande visibilidade, aceitação e apoio financeiro para a produção de 100 dicionários e jogos de tabuleiro para distribuição entre os funcionários do Fórum.
O Comitê de diversidade do TJ-MA tem contribuído para que nossos estudantes tenham acesso ao cinema, referenciando filmes que discutam o racismo e discriminação. Juntamente com o Da cor ao caso Instituto, esse momento foi de encantamento por meio do filme ‘’Pureza”, que relata fatos sobre escravidão contemporânea e contribuiu para que um projeto com tal temática fosse desenvolvido com mais conhecimento.
Tivemos também a oportunidade de assistir ao filme ‘’Medida provisória’’, que nos fez insistir e persistir nessa discussão dentro do ambiente escolar e trazer uma visão de mundo de forma mais ampla, já que certos espaços nunca foram visitados por eles, tais como: museu, cinema, fórum de justiça e outros importantes ambientes.
Resultados
A semana da consciência negra de 2020 foi marcada em nosso estado por grandes ações e essa foi uma das que mais teve repercussão por estar sendo concretizada em um espaço pouco frequentado por estudantes secundários.
O projeto agora é desenvolvido com toda a escola, desde o 8º do ensino fundamental até ao 3º ano do ensino médio, abrangendo dessa forma toda a comunidade escolar e tendo como disciplinas auxiliares sociologia e filosofia.
De 2020 para cá, diversas conquistas foram alcançadas. Parcerias importantes foram firmadas a fim de que o projeto tivesse grande visibilidade em espaços públicos e fortalecesse a identidade racial de uma população muitas vezes marginalizada.
Como estudo sobre inglês negro, desenvolvemos, ainda, um projeto sobre Reggae, em que tivemos o privilégio de trazer para sala de aula um cantor jamaicano que explanou com propriedade o dialeto Patwá, utilizado em regiões da Jamaica. Isso trouxe a riqueza de um conhecimento que não está nos livros.
Dessa forma, pudemos combater o preconceito por meio da própria vivência de um ritmo musical muito forte em terras maranhenses. Ampliar o repertório cultural das alunas e dos alunos sempre deverá ser um dos objetivos propostos pelas ações antirracistas. São essas riquezas que fortalecerão a própria cultura e os farão entender os fatos históricos obscuros que marcam toda uma população discriminada por ter sua história estereotipada e menosprezada.
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Aprendizado significativo
O projeto se deu por meio de aulas on-line, por conta da pandemia, e, utilizando essa estratégia, as alunas e alunos perceberam que era possível aprender inglês de forma contextualizada, diferenciada, onde eles se sentissem referenciados nos materiais didáticos. Tudo que usamos fazia uma conexão com a identidade racial deles.
A língua inglesa passou a ter sentido e a aquisição dessa segunda língua ficou mais significativa. O interesse dos estudantes em conhecerem a história de grandes ativistas, trabalharem música de origem africana e produzirem jogos que pudessem auxiliar outros alunos a entenderem a língua e um pouco das questões étnico-raciais fez muita diferença nessa construção de um ambiente antirracista.
Todos melhoraram bastante na aquisição de aspectos culturais, na construção argumentativa, na compreensão de texto e ampliação de vocabulário. O estudo da língua inglesa passou a ser vista de outra forma, pois havia conexão com a realidade deles.
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