Educadoras criam jogo de trilha para promover autonomia de estudantes

Material pedagógico acessível, desenvolvido com apoio da comunidade escolar, trabalha empatia, autonomia e criatividade com estudantes da educação infantil

A Escola Municipal Antônia Caldas Brandão fica localizada no município de Cabrobó, no interior de Pernambuco. Nossa equipe escolar é composta por 31 funcionários, entre gestão, coordenação, secretaria, auxiliares, educadores e equipe de apoio.

Atualmente a unidade atende 327 estudantes de três a cinco anos na educação infantil. As crianças estão divididas em 12 turmas de meio período, sendo metade de manhã e a outra metade à tarde. Entre o grupo discente, nove estudantes recebem Atendimento Educacional Especializado (AEE) no contraturno do ensino regular de forma remota e presencial. Por conta da pandemia de covid-19, o atendimento presencial ocorre somente em casos extremamente necessários.

Barreiras existentes

A rede municipal de ensino de Cabrobó já vinha enfrentando vários desafios com relação à inclusão de estudantes com deficiência, tanto na sala comum, quanto no AEE. Os principais desafios eram as barreiras atitudinais e pedagógicas. Vínhamos buscando construir um diálogo para mostrar que o currículo pode ser acessível e que todas as crianças, adolescentes, jovens e adultos aprendem.

No início de 2020, a Gerência Regional de Ensino de Pernambuco propôs a discussão do Projeto Escola Inclusiva, porém, com a pandemia, não conseguimos dar continuidade devido ao fechamento das escolas e da situação desafiadora com relação ao atendimento aos estudantes público-alvo da educação especial.

Já em 2021, veio a oportunidade de participarmos da formação Materiais Pedagógicos Acessíveis. Sentimos que era a nossa oportunidade de trabalhar uma questão muito importante: a inclusão de todas e todos os estudantes, sem deixar ninguém para trás.

A construção do material

Para o nosso projeto, decidimos trabalhar com a turma da pré-escola I, composta por 25 estudantes, entre eles um com Transtorno do Espectro Autista (TEA), um com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e outro com paralisia cerebral.

Partindo da realidade da turma, decidimos trabalhar os campos de experiências “O eu, o outro e o nós”, “Corpo, gestos e movimentos” e “Escuta, fala, pensamento e imaginação”, em consonância com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). O objetivo foi promover a autonomia dos estudantes, acolhendo as vivências e os conhecimentos construídos pelas crianças no ambiente da família e no contexto de sua comunidade e articulá-los nas propostas pedagógicas, ampliando o universo de experiências, conhecimentos e habilidades, diversificando e consolidando novas aprendizagens.

A partir disso, começamos a construir o material “Trilhando os campos de experiências”, um jogo de trilha com percurso lúdico desenvolvido com base na fábula “O Leão e o Ratinho”, trabalhada previamente em sala de aula. A ideia da trilha é que as crianças entrem no cenário da história, vivenciando diversas experiências ao seguir um caminho único.

A princípio, fizemos uma maquete do jogo com a ajuda das alunas e dos alunos, que desenharam e pintaram o caminho e as figuras. Mas, depois, decidimos construir no tamanho grande para imersão total das crianças.

Estudante desenha em folha sulfite personagens da fábula O Leão e o Ratinho. Sobre a mesa há lápis, estojo, régua e folhas em branco. Fim da descrição.
Foto: Maria de Lourdes. Fonte: Arquivo pessoal

Para isso, o chão da trilha foi feito de placas de EVA para que as crianças consigam aproveitar ao máximo a experiência com conforto e segurança. Além disso, pensamos em facilitar a locomoção de todos os estudantes, pois as placas permitem a plena participação na atividade.

O caminho da trilha conta com alguns semáforos e efeitos sonoros, no qual utilizamos placas de Arduino para sua construção. Como os educadores não têm o conhecimento da tecnologia proposta, fomos buscar a colaboração de jovens que estudam no Instituto Federal do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE). Eles nos apoiaram nas modificações no circuito do áudio, substituindo o sensor ultrassônico por botões nos quais o usuário pode controlar melhor a reprodução sonora. Já nos semáforos, foram adicionados botões que permitem escolher o momento da troca de cores.

Em sala da escola, três educadoras realizam recortes nas caixas de papelão para montagem do material pedagógico acessível. Fim da descrição.
Foto: Maria de Lourdes. Fonte: Arquivo pessoal

A comunidade escolar também nos ajudou a confeccionar as árvores e os animais que enfeitam a trilha. No período remoto, as crianças, com apoio de suas famílias, desenvolveram diversas atividades com a história, como a confecção de fantoches dos personagens com material reciclável. A rede que prende o ratinho no decorrer da história foi tecida por povos tradicionais indígenas da região.

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A dinâmica do jogo

No início, os estudantes encontram uma caixa, escolhem e vestem a fantasia de um dos personagens da fábula. Em seguida, explicamos sobre o percurso, informando que a caminhada é longa, sendo necessário fazer um aquecimento acompanhando a música “cabeça, ombro, joelho e pé”.

A partir dessa etapa, os semáforos servem para identificar os movimentos de pausa, de prosseguimento e atenção aos desafios (perigo), conforme o andamento da história. Ao seguir a trilha, entram em uma fogueira com tecnologia maker, que muda de cor e aciona o áudio com as vozes dos caçadores que representam o perigo no caminho.

Imagem mostra parte da trilha montada em sala de aula para realização das atividades com os estudantes. Trilha tem seu caminho feito com placas de EVA coloridas, com algumas árvores e figuras de animais da região em papelão. Fim da descrição.
Foto: Maria de Lourdes. Fonte: Arquivo pessoal

Na perspectiva de desenvolver a atenção e a coordenação motora das crianças, a etapa seguinte traz o perigo de um jacaré embaixo da ponte (feita com cadeiras cobertas em tecido azul), na qual os estudantes devem passar com cuidado, além de desviarem de uma fogueira com tecnologia maker, que muda de cor e aciona o áudio com as vozes dos caçadores existentes no caminho.

A trilha ainda tem grandes caixas com faces de diversos animais em que são montadas num grande quebra-cabeça e, por último, a etapa onde o ratinho liberta o leão que estava preso nas redes.

A prática e o aprendizado

Por conta da pandemia, nossa equipe realizou pela primeira vez a atividade presencial com dez estudantes, seguindo todos os protocolos sanitários. As crianças vivenciaram um passeio em uma trilha gigante, em um passeio com diversas linguagens, onde puderam dançar, ouvir histórias e solucionar desafios, como montar quebra-cabeças, atravessar a ponte, imitar animais e cantar.

No cenário da sala, tinha a representação de árvores feitas de papelão e animais da nossa região, valorizando o nosso território. Inserimos a música “Leãozinho”, de Caetano Veloso, em ritmo de xote, para resgatar a cultura musical do Nordeste.

As crianças e a comunidade viram o resultado de um processo inclusivo, que envolveu todas e todos. Isso foi possível pois a formação trouxe diversas mudanças em relação à compreensão do trabalho colaborativo fazendo compreender que, além da equipe discente, dos estudantes e demais profissionais da educação, há outros saberes em nosso território de extrema importância ao processo de ensino-aprendizagem de qualidade e com equidade. Tudo isso foi importante para realização do nosso projeto, proporcionando aos estudantes a construção da autonomia, autocuidado, empatia e criatividade.

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Este relato de experiência é fruto da participação das autoras na edição 2021 do Materiais pedagógicos acessíveis – formação em serviço para educadores envolvidos no processo de escolarização de estudantes público-alvo da educação especial em escolas comuns.

A edição de 2021 do projeto foi realizada pelo Instituto Rodrigo Mendes e o MudaLab, com parceria do Credit Suisse Hedging Griffo e apoio da AT&T, Abadhs, Fundação Grupo Volkswagen e Itaú Social, com objetivo de contribuir na construção de materiais pedagógicos acessíveis que auxiliem o processo de ensino-aprendizagem de estudantes com e sem deficiência.

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