Da escola comum à universidade: educador relata seu ensino inclusivo

João Vitor, educador com síndrome de down, fala sobre sua trajetória em escola comum e como a inclusão o ajudou a ingressar na faculdade de educação física

Desde os primeiros anos de vida, minha mãe e meu pai buscaram estimular meu desenvolvimento cognitivo, psicomotor, social e comunicacional, já que durante a gestação fui diagnosticado com síndrome de down.

Nos primeiro dois meses de vida, morávamos em São Paulo, na casa dos meus avós, até que viemos morar em Curitiba, no Paraná. Mesmo com essa mudança, a família sempre esteve ao meu lado para que eu pudesse me desenvolver mais a cada dia.

Aos dois anos de idade, meus pais decidiram me matricular em uma escola comum, pois entendiam que um lugar com tanta diversidade poderia ser um estímulo para eu continuar progredindo no aspecto social e seria a melhor forma de receber educação de qualidade. Na época, fim dos anos 1980, a educação para pessoas com deficiência em escola comum ainda não era algo acessível, por isso houve uma grande dificuldade para conseguir uma escola que me aceitasse na educação infantil.

João Vitor posa para foto usando uma camiseta preta e uma corrente no pescoço, com pingente prata e formato de cruz. Ele é um homem branco na faixa etária de 30 anos, com barba, bigode e cabelos grisalhos. Fim da descrição.
Fonte: arquivo pessoal.

Após uma longa procura, surgiu a vaga em uma escola particular, onde fui muito bem acolhido pelos profissionais de educação e todos os colegas. Após mais de um ano, por estar na idade da pré-escola, fui transferido para uma instituição educacional particular próxima a minha casa.

Na nova escola, continuei sendo acolhido e vivenciando experiências positivas para o meu aprendizado, o que contribuiu para a minha alfabetização junto com os meus colegas de sala, algo que para muitos era inimaginável por eu ser uma pessoa com deficiência.

Chegando ao ensino fundamental, onde iniciei a terceira escola da minha vida acadêmica, amadureci ainda mais como ser humano e pude desenvolver e potencializar habilidades, com o apoio de educadores e de colegas estudantes da sala. Assim como acontecia nos anos anteriores, sempre participei das atividades pedagógicas propostas para toda a turma, que eram adaptadas quando necessário, o que me fez sentir na prática a educação inclusiva.

Saiba mais

+ Educação inclusiva: como garantir o direito de participar e aprender
+ Alfabetização e inclusão: educadores e familiares de crianças com deficiência contam suas experiências

No decorrer das séries finais do ensino fundamental e durante o ensino médio, tive dificuldade de aprendizagem em algumas disciplinas, mas me empenhava para conseguir assimilar os conteúdos e aprender o que era ensinado, sendo estimulado pelos meus pais.

Eu estudava, brincava e me divertia como qualquer outra criança da minha idade e sempre fui muito bem tratado pelos demais. Isso foi possível pela convivência dentro do ambiente escolar, onde todos sabiam das minhas potencialidades e foram aprendendo a viver com as diferenças. Em alguns momentos passei por situações de preconceito, como pode acontecer com qualquer criança na fase escolar, mas nunca me abalei, uma vez que eram casos isolados e tinha o apoio dos educadores, que trabalharam para valorizar as singularidades e mostrar que nenhuma pessoa é igual a outra.

Vivenciando todo esse processo de inclusão na sala de aula, pude finalizar minha educação básica, ratificando tudo que aquilo que minha mãe e meu pai acreditaram desde o meu nascimento, o que me deu total autonomia para viver plenamente na sociedade.

Ensino superior e carreira

Assim que terminei o ensino médio, em 2005, já tinha em mente qual área seguir: educação física. Desde criança sou fascinado por esportes e daí surgiu a vontade de entrar para essa carreira.

Leia mais sobre práticas inclusivas na disciplina de educação física

+ Dicas para tornar inclusiva a educação física nas escolas
+ Inclusão por meio do esporte: dicas e práticas para a educação física

Para isso, prestei o vestibular na Universidade Tuiuti do Paraná (UTP) e entrei para o curso de Bacharelado em Educação Física e Ciências Biológicas. Minha experiência no ensino superior foi tão exitosa como na educação básica. Sempre fui bem tratado pelo corpo docente, demais profissionais da universidade e, claro, meus colegas de classe.

Em 2008 terminei o curso de bacharel e, em seguida, iniciei o curso de licenciatura em educação física, para seguir a carreira de professor. Como eliminei várias matérias por conta do primeiro curso, terminei a licenciatura em dois anos.

No começo da carreira profissional, trabalhei com ginástica laboral, mas o gosto pelos esportes e com minha licenciatura, entrei para o magistério, e já estou há oito anos dando aulas de educação física para o ensino fundamental e médio no mesmo colégio onde estudei por vários anos.

Saiba mais

+ Curso Portas abertas para a inclusão, educação física inclusiva EAD, completa três anos
+ Relembre a série de webinários sobre educação física inclusiva

É uma realização e uma grande alegria estar atuando nesta área que tanto gosto e poder contribuir para uma maior qualidade de vida das crianças, por meio das atividades físicas.

Após toda essa trajetória, vi que, desde pequeno, a deficiência nunca foi um impeditivo para ter uma vida como a de qualquer pessoa. Contudo, o apoio da família e da comunidade escolar foi imprescindível para que eu tivesse acesso à educação de qualidade e desenvolvesse minha autonomia.

Leia mais

+ Síndrome de Down na escola: dicas e práticas de inclusão
+ A atividade física no desenvolvimento de crianças com síndrome de down
+ “Roleta das rimas” promove alfabetização e comunicação entre estudantes


João Vitor é formado em Educação Física e Ciências Biológicas e atua como professor de educação física para crianças do ensino fundamental e médio de uma escola particular de Curitiba, no Paraná.

Deixe um comentário