É quase senso comum associar educação inclusiva à educação especial, como se a perspectiva inclusiva se referisse apenas aos alunos que são público-alvo da educação especial. Isso se explica, em parte, pelo fato de que a discussão sobre educação inclusiva passou a ser pauta da agenda política na década de 1990, por uma reivindicação das pessoas com deficiência, seus familiares e de grupos organizados em torno da defesa de direitos. De fato, especialmente os estudantes com deficiência estiveram excluídos ou segregados do sistema regular de ensino até recentemente. O movimento no sentido de incluí-los ficou associado à expressão “educação inclusiva”, pois os principais marcos normativos – que são assertivos em relação à perspectiva inclusiva – foram originados a partir do debate da educação especial.
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Esse contexto deu origem a inúmeras formas de se referir às crianças e adolescentes que são o público-alvo da educação especial e que frequentam as escolas regulares. São comuns expressões como “alunos especiais”, “alunos de inclusão”, “alunos incluídos”, entre outras. Vale refletir sobre o que leva as pessoas a considerarem que existem estas duas categorias: os alunos e os alunos de inclusão. Quando fazemos essa polarização há pelo menos duas ideias em jogo. A primeira diz respeito ao que se considera incluir e a segunda, ao que se entende como diferente.
O que consideramos incluir
Para refletirmos a respeito do conceito de inclusão, cabe destacar as contribuições de Amartya Sen, economista indiano. Para Sen, muitas violações de direitos se configuram como situações de exclusão. É o que ocorre, por exemplo, quando alguém não tem acesso ao recurso judiciário ou é destituído de sua liberdade de expressão. Contudo, ele afirma, “uma grande parte dos problemas de privação surge de situações desfavoráveis de inclusão e de condições adversas de participação, e não do que se poderia chamar, sem forçar o termo, de um caso de exclusão”. Na mesma linha de pensamento, o sociólogo brasileiro José de Souza Martins ressalta que a exclusão não existe – o que existe são processos sociais, políticos e econômicos excludentes, que geram uma inclusão precária e instável. Isto é, discutir a exclusão é falar sobre o que não está acontecendo ao invés de focar no que de fato ocorre. Discutindo a exclusão, deixamos de pensar sobre as formas pobres e insuficientes de inclusão.
Embora a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola esteja assegurada na Constituição federal, os indicadores educacionais e as taxas de aprendizado insuficiente revelam que é assustador o número de alunos em situações de desigualdade e desvantagem no Brasil. Segundo dados do QEdu (2015) apenas 50% dos estudantes do 5º ano do ensino fundamental aprenderam o adequado em termos de competência de leitura e 21% apresentaram um atraso escolar de dois anos ou mais. Números que revelam uma realidade de inclusão precária, indecente e injusta, nas palavras dos autores mencionados.
Nesse contexto, muitas das crianças e adolescentes com deficiência sequer são considerados estudantes – são os “alunos de inclusão”, aqueles que simplesmente estão na aula e que frequentemente realizam atividades de forma segregada dos demais. É isso que chamamos incluir? Há muito tempo já sabemos que não basta estar em sala de aula, é necessário também participar e aprender. Então, por que estamos, ano após ano, fracassando na tarefa essencial da escola, que é ensinar? Para responder essa questão vale discutir a segunda ideia que está associada à polarização entre alunos e os alunos de inclusão: nosso entendimento sobre as diferenças.
O que reconhecemos como diferença
Todos sabemos que não existe um ser humano igual ao outro. Somos, naturalmente, diferentes em vários aspectos relacionados à etnia, sexualidade, cultura, subjetividade, genética, entre outros. David Rodrigues, educador português, ressalta que a igualdade só existe do ponto de vista ético, pois é uma construção humana ancorada em valores e no conceito de justiça, que data do século XVIII. Concretamente, o que existe são diferenças, do ponto de vista biopsicossocial.
No entanto, muitas vezes, o que reconhecemos como diferença é uma mistura de diferença e desigualdade, pois percebemos o que é diferente das características que atendem aos padrões hegemônicos como não desejável ou negativo. Ou seja, todas as características humanas e formas de ser que não se encaixam nessa normalidade tendem a ser vistas como desvios. É o que acontece com os chamados “alunos de inclusão” ou com dificuldade de aprendizagem, com estudantes pertencentes a minorias linguísticas, com obesos, entre tantos outros.
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Apesar de sermos essencialmente diferentes, nas escolas, continuamos buscando a homogeneidade no agrupamento, na seriação e nas formas de avaliação. Continuamos achando que turmas heterogêneas são um problema e que a escola existe para ensinar aqueles que correspondem à média em termos de desenvolvimento, sem levar em conta que o normal é a diversidade. Precisamos de forma urgente ressignificar o papel social da escola, assumindo o desafio de ensinar todos os alunos, compreendendo-os como diferentes uns dos outros. Não podemos mais continuar planejando as aulas pensando num grupo homogêneo, pois a mesma estratégia para todos certamente será inadequada para parte deles.
A prática inclusiva é um processo contínuo e coletivo
Todos têm o direito de estar e de aprender na escola e todos estudantes têm direito à diferença sempre que houver necessidade de alguma diferenciação para garantir participação e aprendizagem. Em outras palavras, se todos são diferentes entre si, precisamos simultaneamente diversificar e diferenciar, ou seja, propor estratégias pedagógicas diversificadas e potencialmente adequadas para trabalhar com um grupo heterogêneo e, ao mesmo tempo, propor diferenciações em termos de desafios e apoios, sempre que necessário, para garantir igualdade de oportunidades no processo de escolarização.
Efetivar essa pedagogia inclusiva requer não apenas um professor capacitado, mas também tempo de planejamento, recursos materiais e humanos, trabalho colaborativo entre profissionais e entre escola e família e uma cultura escolar inclusiva dentro e fora da sala de aula. Ou seja, depende de uma prática que envolve múltiplos atores em uma perspectiva sistêmica. Essa realidade pode parecer um tanto distante da realidade das escolas brasileiras, por isso, nessa complexa engrenagem, o xis da questão é compreender que a mudança não é linear. O processo de transformação se dá a partir de pequenas ações, que ocorrem simultaneamente e desencadeiam mudanças nas práticas, na organização dos sistemas de ensino e na cultura educacional. Portanto, em última instância, depende do compromisso ético de cada profissional, de cada família, de cada escola ou rede de ensino, com uma educação de qualidade para todos.
Não existe um caminho único ou uma metodologia que possa ser simplesmente aplicada, nem mesmo uma capacitação que seja suficiente. A educação numa perspectiva inclusiva se efetiva por meio de um processo contínuo e coletivo de reflexão sobre a prática, tendo como base os conceitos de inclusão, igualdade e diferença.
Marília Costa Dias é graduada em pedagogia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É mestre e doutora em educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE-USP). Atualmente é professora no Instituto Superior de Educação Vera Cruz e coordenadora pedagógica na Comunidade Educativa Cedac.
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55 Comentários
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Manter o olhar para o bem-estar e o respeito ao tempo de cada um ,com a certeza que o ambiente escolar é o seu lugar de pertencimento ! Teremos sim a inclusão.
Precisamos respeitar a individualidade e o tempo de cada aluno
O respeito à individualidade de cada estudante, bem como um olhar atento às suas dificuldades, vivência de mundo e bagagem cultural é muito importante. Sem esses requisitos não há inclusão na prática.
Na atual conjuntura vejo que estamos muito longe de uma efetiva política de inclusão.
ótimo texto! O desconhecimento dos significados e diferenças entre as condições das pessoas, perpetua a desigualdade de direitos.
Perfeito concordo plenamente com suas colocações. Excelente texto; excelente conteúdo.
Somente respeitando a individualidade de cada aluno que teremos a verdadeira inclusão.
Não existe receita para uma educação inclusiva, pois somos diferentes, mas precisamos tentar é através das tentativas que vamos errando e acertando até entendermos a individualidade daquele aluno.
Precisamos identificar ou reconhecer as necessidades individuais, promovendo assim, a inclusão pertinente.
A inclusão não eé simplesmente estar no lugar mas fazer parte dele.
A inclusão escolar promove a diversidade no ambiente educacional, permitindo que estudantes de diferentes origens, habilidades e características compartilhem experiências. Isso ajuda a construir uma cultura de tolerância e respeito às diferenças desde cedo, preparando os alunos para viver em uma sociedade plural.
Após essa leitura, concluo que, precisamos de forma urgente ressignificar o papel social da escola, assumindo o desafio de ensinar todos os alunos, compreendendo-os como diferentes uns dos outros. Não podemos mais continuar planejando as aulas pensando num grupo homogêneo, pois a mesma estratégia para todos certamente será inadequada para parte deles.
A inclusão ocorre em ambiente de equidade plena, não somente na prática dos educadores e educandos, mas nas condições estruturais de uma escola.
A educação inclusiva não é um processo a curto prazo e precisa muita capacitação.
A inclusão se faz presente no cotidiano das escolas e deve ser praticada na integra, observando as particularidades e necessidades de cada estudante, construindo um ambiente plural capaz de motivar educandos e educadores a praticar a inclusão com normalidade como realmente ela deve ser tratada.
É de extrema importância uma análise crítica sobre a educação inclusiva, desafiando a visão limitada que a associa apenas aos alunos com deficiência. Abordar questões sobre o fracasso da escola em garantir a verdadeira inclusão, é o primeiro passo para que as diferenças sejam valorizadas e possa haver a transformação da educação. A ideia de que a inclusão é um processo contínuo, que depende de mudanças sistêmicas e culturais na escola, reforça a necessidade de um compromisso ético de todos os envolvidos na educação.
Atualmente no cenário brasileiro infelizmente, muitas vezes, nos deparamos com uma ‘inclusão precária”. Conforme diz o texto, uma pedagogia inclusiva demanda uma ação que não depende somente da capacitação do professor, mas de um trabalho que em rede, uma mudança cultural.
Reconhecer as diferenças e buscar meios que propiciem a inclusão.
Estar em constante aperfeiçoamento, buscando melhorias nos aspectos pedagógicos e físicos estruturais no ambiente escolar em conjunto com os múltiplos autores.
Análise crítica sobre a educação inclusiva, desafiando a visão limitada que a associa apenas aos alunos com deficiência. Abordar questões sobre o fracasso da escola em garantir a verdadeira inclusão, é o primeiro passo para que as diferenças sejam valorizadas e possa haver a transformação da educação. A ideia de que a inclusão é um processo contínuo, que depende de mudanças sistêmicas e culturais na escola, reforça a necessidade de um compromisso ético de todos os envolvidos na educação.
A inclusão verdadeira somente acontecerá quando realmente as diferenças e especificdades de cada um for respeitada em sua totalidade como ser humano. As leis no papel são maravilhosas, porém na realidade do cotidiano são falhas, precarias e não atendem a todos como deveria ser na integra e no direito.
A inclusão deve ser parte do cotidiano escolar, sendo aplicada de forma integral, levando em conta as particularidades e necessidades de cada estudante. É essencial criar um ambiente plural que motive tanto educandos quanto educadores a vivenciarem a inclusão de maneira natural, como deve ser.
A inclusão se faz com a preocupação de fazer o aluno se sentir inserido e valorizado no ambiente escolar, respeitando suas limitações e promovendo suas habilidades.
A inclusão é uma maneira de ensinar com abordagens, estruturas e estratégias de educação que tem objetivo de superar barreiras, com a visão de oferecer a TODOS estudantes uma experiência e um ambiente de aprendizagem igualitário e participativo.
Precisamos identificar ou reconhecer as necessidades individuais, promovendo assim, a inclusão pertinente.
É preciso politicas públicas mais eficientes para que realmente ocorra a inclusão. Ter recursos financeiros e pessoal, e acima de tudo ter e ser inclusivo.
Concordo,somos carentes de pessoal especializado para poder realmente fazer a inclusão acontecer.
A educação deve estar sempre aberta as mudanças; em se tratrando de inclusão então ,devemos ter mais empatia olhar as pessoas com mais carinho, praticar as virtudes da bondade,caridade, humanidade,
paciência e principalmente amor aos nossos alunos.
Muito bom!
A inclusão precisa ser vista como uma possibilidade e não como uma dificuldade, por todo o grupo de professores. É preciso ter o entendimento e a compreensão de que cada aluno, com necessidades especiais ou não, possuem diferentes formas de ver o mundo e de aprender. E o primeiro passo para a inclusão acontecer, é o acolhimento.
A inclusão escolar visa garantir o acesso e a permanência de todos na escola,respeitando as diferenças e particularidades de cada um.
Inclusão é dar possibilidades para que todos consigam evoluir, respeitando sempre as individualidades.
Sabemos que em educação não existe uma receita pronta, não existe apenas um caminho ou uma metodologia correta, mas é urgente a conscientização de todos os profissionais do ensino que a educação é direiro de todos e que cabe a nós educadores conhecer e respeitar a individualidade dos educandos, para então proporcionar uma educação de qualidade para todos
É preciso garantir o acesso e a permanência de todos na escola, respeitando as diferenças e particularidades de cada um
A inclusão só acontecerá quando as diferenças e particularidades de cada um forem respeitadas em sua totalidade.
Cada um tem o seu tempo e a sua individualidade que torna-se necessária para que aconteça o avanço nas aprendizagens, e isso precisa ser respeitado.
Muito interessante o conteúdo
Ainda nos falta recursos, rede de apoio e RH suficientes para garantir a verdadeira inclusão dos nossos alunos especiais, que as mudanças aconteçam verdadeiramente na prática.
A inclusão ocorre quando todos tem respeito as individualidades de cada ser humano.
A educação inclusiva ainda impõe muitas barreiras, pois a inclusão é um direito reservado para os alunos com deficiência e deve ser revista e aprimorada obtendo o suporte necessário para atender as dificuldades específicas de cada educando.
Uma pessoa com deficiência, considerando aqui a escola, tem o diretio e merece atenção especial. Como indivíduo, tem os mesmos direitos e deveres daqueles que não têm deficência, e por esse motivo deve ser integrado ao meio escolar, respeitando sua individualidade e recebendo o devido atendimento, levando em conta suas necessidades.
A educação inclusiva requer planejamento constante, é preciso metodologias diferenciadas para atender as individualidades dos que apresentam deficiência. Pois, todos devem ser interagidos ao meio escolar e desenvolver o processo aprendizagem de acordo com suas potencialidades.
Escola e educação inclusiva é, aquela que garante a qualidade de ensino educacional a cada um de seus alunos, reconhecendo e respeitando a diversidade e respondendo a cada um de acordo com suas potencialidades e necessidades.
A educação inclusiva é fundamental para garantir que todos os estudantes, independentemente de suas diferenças e necessidades, tenham acesso equitativo ao aprendizado e ao desenvolvimento social. Ela promove um ambiente de respeito, diversidade e valorização das individualidades, contribuindo para a formação de uma sociedade mais justa, inclusiva e empática.
educação inclusiva e fundamental para nossos educandos ,pois ela promove uma formação justa,com empatia.
A educação inclusiva
A educação inclusiva requer um olhar especial, um tratamento com empatia,carinho e dedicação,um profissional com um preparo adequado.
Na teoria sabemos que a educação inclusiva é amparada por lei que estabelece igualdade e direitos iguais, porém, por mais que as políticas públicas “lutem” para firmar essa conquista, ainda vemos na prática uma situação bem diferenciada, onde alunos especiais ficam excluídos de diversas práticas por falta de estrutura das escolas e/ou falta de capacitação dos professores e funcionários.
A inclusão ocorre em ambiente de equidade plena, não somente na prática dos educadores e educandos, mas nas condições estruturais de uma escola.
A inclusão requer muito mais do que acolher e permitir a distribuição de alunos “diferentes” em turmas tidas como “normais”.
A educação inclusiva é quando todos os sujeitos envolvidos tem acesso,possam manisfestar sua opinião, seu pensamento e oportunizar a todos uma convivência harmoniosa e respeitando o tempo e o espaço de cada educando.
A inclusão é uma via de mão dupla.
a educação inclusiva é um caminho para a aprendizagem significativa e para todos
A inclusão requer uma atenção especial e um tratamento com empatia e carinho além de, preparo profissional.
A educação inclusiva é fundamental para vencermos os preconceitos e ofertar uma educação de qualidade aos nossos alunos.
RESPEITO ÀS DIFERENÇAS, INCLUIR PARA PODERMOS VENCER OS PRECONCEITOS