Língua de sinais na escola: conhecer para oportunizar

No mês em que se comemora o Dia Internacional das Línguas de Sinais, algumas perguntas se tornam importantes reflexões: “Você já imaginou como seria o mundo sem som?” e “Como pode ser a vida de um estudante sem o sentido da audição?”

Muitos foram os avanços obtidos pela comunidade surda. Após um longo tempo de imposição mundial do oralismo – da fala –, o reconhecimento das línguas de sinais foi extremamente significativo e uma das maiores conquistas dos surdos no mundo.

No Brasil, a Língua Brasileira de Sinais (Libras) foi reconhecida como meio legal de comunicação e expressão em 2002, por meio da Lei Nº 10.436, regulamentada pelo Decreto 5.626, em 2005.

Ao se considerar uma língua, uma cultura, valoriza-se um povo e sua identidade. Compreendendo a pessoa surda como sujeito capaz e a surdez como diferença linguística, o indivíduo ganha espaço e representatividade na sociedade majoritariamente ouvinte.

Reconhecer a língua de sinais significa compreender que a pessoa com deficiência auditiva precisa de estratégias visuais em seu processo de aprendizagem, considerando que o acesso ao conhecimento não ocorre pela via sonora.

Perlin e Miranda (2003), autores surdos, enfatizam a experiência visual dessa comunidade:

Experiência visual significa a utilização da visão (em substituição total a audição), como meio de comunicação. Desta experiencia visual surge a cultura surda representada pela língua de sinais, pelo modo diferente de ser, de se expressar, de conhecer o mundo, de entrar nas artes, no conhecimento científico e acadêmico. A cultura surda comporta a língua de sinas, a necessidade do intérprete, de tecnologia de leitura.

 

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Dessa forma, torna-se fundamental que os educadores conheçam as singularidades do estudante surdo e as necessidades de adequação de estratégias pedagógicas, adotando uma pedagogia visual.

Para tanto, no caso de pessoas surdas sinalizantes, faz-se necessário o conhecimento acerca da língua de sinais, bem como das questões culturais dessa população.

Vale ressaltar, ainda, que há grande diversidade de comunidades surdas e, conforme Wilcox (2005):

Cada grupo é organizado de modo diferente, de acordo com suas necessidades, isso não significa que todas as pessoas surdas no mundo compartilhem da mesma cultura. Por exemplo, já existem pelo mundo diferentes Associações, como a de Surdos Oralizados (Argentina), a Associação de Surdos Negros nos Estados Unidos, no Brasil a associação de Surdos Gays, Comunidades de Surdos Implantados e outras.

Assim, torna-se importante saber qual a cultura predominante na vida do estudante surdo, cujo contato se dará na escola, para adequar as estratégias pedagógicas. Será uma abordagem oralizada? Bilíngue? Considerando que o mais importante é respeitar a identidade do surdo, seu desejo de sinalizar ou de oralizar.

Importância da comunicação

A criança que não se comunica de maneira verbal em sala de aula comum pode ser incompreendida e tratada com preconceito.

O fato é que a criança surda possui capacidades cognitivas que, para serem notadas, precisam de uma língua que dê vazão aos pensamentos que possuem organização linguística.

A surdez pode ser responsável pelo isolamento social, interferindo diretamente no desenvolvimento da linguagem e da fala, no desenvolvimento emocional, social e no processo de aprendizagem.

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Ao ter conhecimento das capacidades cognitivas da pessoa surda, percebe-se que sua língua possui uma organização gramatical, que não é linear como o português escrito, mas tem a capacidade de informar, comunicar e relatar fatos, fazendo uso da língua espaço-visual.

Ao conceber, ainda, o processo de aprendizagem como algo diferenciado para cada pessoa, deve-se observar a necessidade de ressignificar as estratégias de ensino de maneira a atender todos os estudantes em suas singularidades.

Buscar conhecimento constante auxilia o educador nesse sentido. Valorizar a língua do surdo e suas produções, colocar o estudante em contato com diversos gêneros textuais e possibilitar que perceba as funções sociais da escrita são fatores muito importantes para uma aprendizagem real e significativa.


Referências

BRASIL. Lei Nº 10.406, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais- LIBRAS e o art. 18 da Lei 10.098 de 19 de dezembro de 2000.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO- MEC. Decreto Nº 5626 Regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Publicada no Diário Oficial da União em 22/12/2005

MOURA, Cecilia Surdez e linguagem, 2009 in: Tenho um aluno surdo, e agora? Introdução a Libras e educação de surdos. São Carlos: EDUFSCar, 2013

PERLIN, Gladis; MIRANDA, Wilson. Surdos: O narrar e a política. Revista. Revista de Educação e Processos inclusivos, UFSC/ CED/ NUP/ Florianópolis, nº 5, 2003

WILCOX, Sherman; WILCOX, Phyllis Perrin. Aprender a ver. Rio de Janeiro: Arara Azul, 2005.


Valdineia Nascimento é psicopedagoga e intérprete de Libras na rede pública municipal de Jundiaí (SP) e docente na esfera acadêmica na instituição privada Unianchieta. É especialista em Psicopedagogia Institucional e em Tradução e Interpretação Libras/Língua Portuguesa.

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