O uso de recursos digitais nas escolas se tornou parte da realidade educacional. Com a adoção do ensino remoto ou híbrido, a oferta dessas tecnologias se intensificou. Atualmente, elas estão cada vez mais presentes no dia a dia das salas de aula e no currículo escolar. A implementação do Novo Ensino Médio, a partir de 2022, é uma oportunidade para que educadores e gestores construam os projetos político-pedagógicos (PPP) de suas escolas incorporando novas ferramentas, como conteúdo interativo, plataformas e aplicativos.
Os recursos digitais podem contribuir para a construção de ambientes escolares inclusivos. Tecnologias e materiais educacionais acessíveis impulsionam a independência, a participação e o progresso de estudantes por meio de formas de aprendizagem variadas. Do ponto de vista pedagógico, as tecnologias podem apoiar a construção de metodologias que singularizem a aprendizagem e contemplem todas as alunas e alunos. Para isso, devem atender as necessidades individuais em um ensino que é comum, sem deixar ninguém para trás.
A pesquisa Tecnologias digitais aplicadas à Educação Inclusiva: Fortalecendo o Desenho Universal para Aprendizagem acompanhou, no Brasil, a oferta de tecnologias educacionais digitais que promovem a inclusão de todas e todos na educação básica. A pesquisa foi realizada pelo Núcleo de Pesquisa e Tecnologias do Instituto Rodrigo Mendes (IRM), em parceria com o Instituto Unibanco.
Na pesquisa, foram listadas diversas soluções que contribuem para a inclusão escolar. A partir dos resultados alcançados, foi produzido um panorama atual da oferta dessas tecnologias. Neste artigo, são apresentados alguns exemplos ofertados pelos seguintes atores:
• Empresas Big techs
• Startups
• Órgãos públicos
• Agências especializadas
Empresas big techs
Algumas das principais soluções de tecnologias educacionais para consumidores finais são ofertadas por empresas de grande porte, em geral denominadas “big techs” ou “gigantes globais” da educação. Segundo a taxonomia Global Learning Landscape, há atualmente 13 principais empresas nessa categoria. A pesquisa entrevistou representantes de três delas: Google, Microsoft e Facebook. Todas as empresas informaram que desenvolvem produtos ou apoiam programas que visam promover a inclusão e a diversidade nas escolas. No caso do Google, possui destaque a plataforma Workspace. Na Microsoft, as Ferramentas de aprendizagem digital centrada no estudante buscam oferecer experiências de aprendizado personalizadas. O Facebook apoia iniciativas como o Cidadão Digital e Conectando seu Futuro. Elas visam alcançar comunidades vulneráveis e oferecer acesso a oportunidades.
A descrição completa dessas soluções estará disponível em breve, no relatório final da pesquisa.
Startups do setor educacional brasileiro
No Brasil, o setor de tecnologias educacionais encontra-se em expansão. Há uma variedade de soluções e produtos inovadores, muitos dos quais são desenvolvidos por empresas startups. O Mapeamento Edtech 2020 identificou 566 startups educacionais atuantes no território brasileiro. Suas soluções abrangem todas as modalidades de ensino, mas em sua grande maioria se destinam à educação infantil e à educação básica (63,5%). Grande parte delas está localizada no estado de São Paulo (58,7%).
Nesse universo, apenas uma parcela reduzida de startups oferece soluções acessíveis, voltadas à singularização da aprendizagem, na qual todas as pessoas podem ter acesso, ou destinadas a estudantes com deficiência. Exemplos são o app Fofuu e a plataforma Piraporiando.
Órgãos públicos
Nas escolas brasileiras de educação básica, a oferta de tecnologias educacionais por órgãos públicos ocorre de várias formas. Há ações federais de caráter universal, que atingem todos os níveis administrativos, e outras que obedecem à dependência administrativa local das escolas, sob gestão estadual ou municipal.
A oferta de tecnologias pode atender necessidades de infraestrutura e de conteúdo. Nos casos em que ocorre investimento direto em infraestrutura e equipamentos, os recursos podem ser disponibilizados pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Outra forma de ofertar tecnologias ocorre via programas de autarquias como o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que faz transferências de recursos para programas e ações, como o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), ou mesmo através de verbas de emendas parlamentares.
Um exemplo de investimento em infraestrutura é o Programa de Inovação Educação Conectada (PIEC), no qual escolas são preparadas para o uso de internet e de tecnologias educacionais. Já a oferta de Recursos Educacionais Digitais é em geral viabilizada por programas ministeriais, de secretarias estaduais e municipais, como os repositórios Plataforma integrada (MEC) e Centro de Mídias SP.
Agências especializadas de organizações intergovernamentais
No plano internacional, é amplamente reconhecida a presença das agências especializadas de organizações intergovernamentais no debate contemporâneo sobre educação, educação inclusiva e uso de tecnologias. Algumas delas, como o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), têm direcionado investimentos para startups educacionais em estágio inicial (seed). A proposta é incentivar soluções de aprendizagem adaptável usando machine learning (aprendizado automático), ciência de dados ou inteligência artificial. Entre as respostas das agências intergovernamentais à pandemia da covid-19, destaca-se a Global Education Coalition. Liderada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), é uma plataforma de colaboração e intercâmbio para proteger o direito à educação. Por meio da ação Distance learning solutions, a UNESCO também disponibilizou uma lista de aplicativos, plataformas e recursos educacionais, onde visa ajudar mães, pais, professoras, professores, gestoras e gestores escolares a facilitar a aprendizagem de estudantes durante o fechamento das escolas. A consulta a essa lista é útil para todos os atores interessados em conhecer novas tecnologias educacionais.
Por uma nova cultura: o uso de tecnologias a favor da inclusão
Vivemos hoje um momento de entusiasmo em relação à oferta de soluções por empresas de tecnologia do setor educacional, comumente referido como “Edtech”. É um momento oportuno para indagar o quanto essas soluções são acessíveis e inclusivas desde a sua concepção. Em outras palavras, o quanto estamos passando de soluções “digitais nativas” (“born digital”) para soluções “acessíveis nativas” (“born accessible”)?
Conforme destacou o relatório Digital Education Outlook da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), é possível vislumbrar três principais cenários contemporâneos de digitalização em escolas: (I) pouca adoção de tecnologias; (II) significativa adoção de tecnologias; e (III) educação baseada em tecnologias.
Os últimos dois cenários possuem implicações diretas para educadores e, sobretudo, para processos de ensino e aprendizagem. Neles, as tecnologias educacionais provavelmente desempenharão um papel cada vez mais central para os estudantes. Será necessário fornecer formações e atualizações para as professoras e os professores tomarem decisões informadas sobre o uso dessas tecnologias em sala de aula. Caberá aos gestores escolares e demais educadores planejar a adoção desses recursos, segundo as necessidades e objetivos curriculares.
As fronteiras da educação digital trazem oportunidades e desafios, dos quais o Instituto Rodrigo Mendes enfatiza a necessidade de se consolidar formatos de aprendizagem inclusivos, que contemplem a diversidade humana.
Se hoje temos a oportunidade de transformar a educação usando tecnologias, esforços podem ser direcionados à ampliação das oportunidades de aprendizagem por meio da inclusão de todos os estudantes nas escolas comuns. As tecnologias podem ser um meio para operar mudanças profundas na cultura educacional − principalmente universalizar o acesso à educação e transformar barreiras atitudinais à medida em que encoraja a diversidade em sala de aula.
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Karolyne Ferreira é pesquisadora assistente do Instituto Rodrigo Mendes. Bacharel e licenciada em Geografia e mestre em ciências pela Universidade de São Paulo (USP).
Gustavo Taniguti é pesquisador do Instituto Rodrigo Mendes. Possui mestrado e doutorado em sociologia, realizou estágios de pesquisa nos Estados Unidos e na França e foi professor do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG).
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