Coordenadora do projeto “Braille básico” relata iniciativa de estudantes de ministrar curso sobre o sistema de escrita para a comunidade escolar
A inclusão e o compromisso social estão expressos como compromissos na missão do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS).
A instituição tem 17 campi no estado, sendo um deles o Campus Osório, que atende estudantes de vários municípios dessa região. Essa unidade atua desde 2010 e atualmente oferta cursos técnicos que podem ser cursados junto com o ensino médio ou cursos superiores e de pós-graduação.
O estudante da IFRS Victor Lucena conta que, desde que perdeu a visão aos 13 anos, seu processo de evolução tem sido constante, pois sempre surgem novas necessidades e adaptações que precisam ser feitas.
Com o reconhecimento das barreiras enfrentadas em seu cotidiano, em 2018, Victor e seu colega, Jean Gustavo, estudantes do ensino médio do Campus Osório na época, tomaram uma decisão ousada e corajosa: ensinar braile para a comunidade escolar do campus.
“Foi uma oportunidade de compartilhar um conhecimento que tenho com as pessoas. Sempre achei muito importante que as pessoas fossem formadas a respeito do que é a deficiência visual e como conviver com ela, tanto na vida cotidiana quanto na internet, e o projeto foi uma forma de mostrar um pouco para as pessoas como funciona o braile, a minha locomoção, e de repente até comentar a respeito com terceiros”, conta Victor.
Depois de peregrinar pela instituição nos diversos setores pedagógicos em busca de auxílio e orientação de como organizar e pôr em prática o projeto, não encontrando nenhum servidor com conhecimento no Sistema Braille disposto a ajudar na implantação, os jovens chegaram a uma técnica administrativa com cursos realizados na Fundação de Articulação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência e com Altas Habilidades (Faders) e no Instituto Benjamin Constant.
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Realização do “Braille básico”
A elaboração, organização e implementação do projeto de ensino “Braille básico” teve duração de dois meses no ano de 2018. Após todas as pesquisas de interesse no tema proposto e da publicação das inscrições no curso com oferta de 15 vagas, deu-se a primeira aula, com 8 encontros de 3 horas semanais, totalizando 24 horas em dois meses.
A surpresa ficou por conta da adesão de 100% de alunas e alunos. No entanto, não houve nenhuma inscrição de técnicos-administrativos e docentes. Essa participação seria de extrema importância, visto que a capacitação no Sistema Braille e seus recursos pedagógicos, bem como as práticas de orientação e mobilidade, seriam desenvolvidas para proporcionar uma convivência mais harmoniosa e um atendimento mais qualificado aos estudantes com deficiência visual, garantindo-lhes acessibilidade de locomoção e desenvolvimento de sua formação didático-pedagógica.
Com a aceitação, a participação efetiva do público discente no curso e o reconhecimento de sua importância para a formação humana e crescimento como cidadãos na sociedade, projetou-se uma nova edição, já com uma formatação mais ampla, abrangendo a comunidade do entorno.
No ano de 2019, o projeto passou a oferecer 25 vagas, com 30 encontros de 3 horas semanais, totalizando 30 horas de curso. Houve a adesão de professoras e estudantes da rede estadual e municipal, profissionais liberais e de uma professora do campus, que declarou a necessidade de uma formação continuada sobre educação inclusiva.
Além do impacto positivo na comunidade, o estudante Victor declara que também evoluiu fazendo parte do projeto: “Especialmente pela questão de reconhecer e entender que posso, sim, me impor dentro dos espaços, que eu posso ser representativo. Além das questões de comunicação: quando entrei no ensino médio, eu tinha mais dificuldade de falar em público, hoje essa comunicação se tornou algo praticamente natural para mim, e o projeto foi o primeiro passo que dei em direção a isso”.
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Reconhecimento do projeto
No segundo semestre de 2019, aconteceu a 3ª edição do “Braille básico”, já conhecido e reconhecido na comunidade acadêmica, no município e nas cidades vizinhas, com contatos de outras escolas com intenção de que o projeto fosse oferecido aos seus docentes.
No mesmo ano, o “Braille básico” participou de diversas mostras científicas dentro da rede IFRS, enviando resumos para apreciação e obtendo aceite em todos, e uma premiação na IV Mostra de Ensino, Pesquisa e Extensão do IFRS do Campus Rolante. Além disso, o projeto foi inscrito no Desafio Criativos da Escola, uma iniciativa do Instituto Alana, sendo um dos projetos finalistas, obtendo reconhecimento nacional.