Material pedagógico acessível auxilia apreensão da leitura e da escrita por meio de jogo colaborativo entre estudantes do ensino fundamental
A EMEFEI Dante Gazzetta, localizada em Nova Odessa (SP), foi uma das unidades escolares participantes da formação Materiais Pedagógicos Acessíveis de 2020, promovida pelo Instituto Rodrigo Mendes. O curso é voltado para educadores envolvidos no processo de escolarização de estudantes público-alvo da educação especial em escolas comuns.
Como parte da formação, fomos desafiadas a apresentar uma situação pedagógica desafiadora de nossa unidade. A turma de 2º ano foi escolhida: constituída por trinta estudantes, contava com cinco alunos que, no início do ano letivo, ainda estavam em um ponto muito inicial do processo de aquisição da leitura e da escrita. Uma delas, dentre os que apresentavam dificuldade de aprendizagem, tinha deficiência intelectual.
Em um primeiro momento, a dificuldade na aquisição da leitura e da escrita é uma situação completamente normal, já que o 2º ano ainda é o momento de a criança desenvolver, aprofundar e consolidar o processo de alfabetização. Mas o que tornou esse contexto um desafio significativo para nossa equipe pedagógica foi o fato de termos alunos apresentando pouca autonomia em relação ao processo de aprendizagem, insegurança e medo em aceitar desafios.
Analisando nossa situação, identificamos barreiras nas metodologias, estratégias e materiais utilizados no processo de ensino, pois não estavam atendendo eficientemente a todos os alunos. As crianças que apresentavam dificuldades estavam passivas no contexto e notamos que propostas que privilegiavam a realização de atividades individuais também eram barreiras ao desenvolvimento da turma.
Concluímos que precisaríamos buscar estratégias para que todos os estudantes tivessem acesso e evolução no processo de alfabetização. Ou seja: garantir meios e modos para que todos tivessem as mesmas oportunidades em relação ao processo de ensino-aprendizagem.
Sabendo que todas as crianças aprendem, mas aprendem de maneiras diferentes, traçamos como objetivo a construção de um material pedagógico acessível (MPA) para incentivar a participação ativa e com êxito de todos os estudantes.
Nossa ideia foi envolver o desenvolvimento das habilidades de leitura e de escrita a partir da elaboração de um jogo. Isso porque acreditamos que uma proposta lúdica e interativa favorece a concentração e traz segurança para os alunos.
Todo o processo de concepção do MPA foi realizado coletivamente pela equipe pedagógica composta pela gestora municipal, coordenadora pedagógica, professora polivalente e professora de Atendimento Educacional Especializado (AEE). As ações foram articuladas e cada membro da equipe pôde contribuir e participar de todas as etapas do projeto.
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Corrida do desafio
O recurso pedagógico criado foi um jogo de tabuleiro que denominamos “Corrida do desafio”. É uma trilha que pode ser percorrida em equipes, o que proporciona ludicidade, interação e construção coletiva de conhecimento.
A Corrida do desafio é composta por elementos da realidade escolar, como ruas, carros de brinquedo e semáforo eletrônico. Como material auxiliar, foi construída uma caixa sonora que contém poemas, canções e parlendas para auxiliar o processo de alfabetização.
Para jogar, os estudantes devem montar equipes de duas ou três pessoas. Em cada rodada, um dos estudantes do grupo sorteia um número no dado e o carrinho da equipe percorre o caminho (número de casas) correspondente na trilha. Após essa etapa, um dos alunos da equipe aperta o botão da caixa eletrônica, que reproduzirá um pequeno texto (parlenda, poemas, canções da cultura infantil) e, ao término da reprodução, será desafiado a escrever uma palavra (referente ao texto reproduzido em áudio).
O jogo possui cards com os textos e comandas escritos (iguais ao reproduzidos sonoramente pela caixa eletrônica).
Após ouvir ou ler o texto e a comanda, outro estudante deve apertar o botão do semáforo, que determinará o tempo para a construção da palavra. A cor verde indica “siga – construa a palavra”, a cor amarela indica “atenção – conclua a escrita” e a cor vermelha indica “pare – o tempo acabou”. Na caixa de letras móveis (organizadas na sequência do alfabeto), os alunos da equipe devem pegar as letras e construir a palavra (resposta).
O tempo para a construção da palavra é determinado pelo semáforo. Após esse tempo, um aluno aperta novamente o botão da caixa eletrônica, que reproduz as letras que compõe a palavra, para que a equipe verifique se conseguiu escrever corretamente. Se a equipe não conseguir escrever corretamente a palavra, perde uma jogada. Vence o jogo a equipe que chegar primeiro ao fim da trilha.
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Aplicação do material
Os estudantes puderam interagir durante todo o tempo destinado para o jogo quando avançavam na frente da outra equipe, bem como em momentos em que conseguiam solucionar o desafio, reconheciam as parlendas ou canções reproduzidas pelo áudio ou se perdiam no caminho a ser percorrido.
Esperávamos que não só aprendessem a registrar as palavras alfabeticamente, mas que também avançassem no seu processo de aquisição da escrita mediante a exploração do repertório de textos e cantigas populares.
O MPA foi planejado para ser utilizado durante o ensino presencial, de forma coletiva com a mediação do professor, mas, por ser um material de uso simples e intuitivo, pode ser utilizado na casa do estudante, tomando os cuidados necessários com os equipamentos tecnológicos.
Suspensão das aulas presenciais
Tivemos uma preocupação ainda maior com os alunos nesse momento de pandemia, pois o fato de não estarem presentes diariamente na escola dificulta o acompanhamento do desenvolvimento de sua aprendizagem. Por isso, pensamos em diferentes estratégias para alcançá-los e eliminar as barreiras que foram acentuadas com a suspensão das aulas presenciais.
As contribuições dos estudantes na construção do MPA aconteceram de forma remota. Eles contribuíram com a seleção dos textos (parlendas, canções e poemas) que compõem as comandas do jogo. A nossa rede de apoio foi constituída também pelos familiares, que auxiliaram na montagem das tecnologias e confecção da parte física do jogo.
Decidimos não circular o jogo pelas casas dos alunos por questões sanitárias, devido a possibilidade de contaminação. Chegamos ao consenso de que o MPA deve ser introduzido no retorno das aulas presenciais, no espaço escolar, momento em que as crianças poderão familiarizar-se com o jogo. Nada impede, contudo, que, em um outro momento, os alunos possam utilizá-lo em suas casas.
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Princípios do Desenho Universal para a Aprendizagem
Na construção do jogo, buscamos atender aos princípios que guiam o conceito de Desenho Universal para a Aprendizagem. Ou seja, planejar estratégias e produzir um material pedagógico que possa ser utilizado por todos os alunos, com e sem deficiência, sem a necessidade de adaptações.
Todo o processo de planejamento e construção do MPA foi norteado pelo objetivo de construir um material pedagógico de uso simples, perceptível e intuitivo que pudesse proporcionar o desenvolvimento da aprendizagem de alunos com diferentes capacidades e habilidades.
O jogo não exige nenhum tipo de esforço físico, e pensamos em um tamanho de tabuleiro que não fosse pequeno a ponto de prejudicar a visibilidade e a compreensão, mas também não muito grande para que eles pudessem levar o recurso para casa.
O jogo foi utilizado por equipes exatamente para que um estudante pudesse ajudar o outro, de forma que a atividade fosse cooperativa. Após o tempo para a realização da comanda, o próprio material ajuda o aluno a conferir a construção da palavra, lembrando que o foco não está no acerto ou no erro, mas sim no processo de construção.
Avaliação do projeto
Inicialmente, tivemos bastante dificuldade para refletir sobre como poderíamos utilizar as tecnologias a favor da aprendizagem dos nossos alunos e como faríamos isso, tendo em vista que não tínhamos experiência prévia no assunto.
Formamos uma equipe muito produtiva, onde as discussões a respeito do processo de construção do MPA contribuíram positivamente, resultando no sucesso do produto final, uma vez que cada integrante contribuiu com saberes específicos da sua área de atuação.
As discussões proporcionadas nos encontros formativos foram de grande relevância, percebemos que os nossos desafios são os mesmos dos demais grupos e municípios. Todos precisamos enfrentar as dificuldades na utilização das tecnologias, que estão pouco presentes nos nossos projetos diários.
O projeto contribuiu muito para o desenvolvimento da percepção sobre o aprendizado dos alunos. Nós pensamos nas dificuldades apresentadas pela turma, nas barreiras existentes no processo e buscamos construir um material com o qual todos os alunos pudessem participar ativamente do processo de ensino-aprendizagem.
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Este relato de experiência é fruto da participação das autoras na edição 2020 do Materiais pedagógicos acessíveis – formação em serviço para educadores envolvidos no processo de escolarização de estudantes público-alvo da educação especial em escolas comuns.
A edição de 2020 do projeto foi realizada pelo Instituto Rodrigo Mendes e o MudaLab, com a parceria do Credit Suisse Hedging Griffo e do Instituto Península, e apoio da AT&T e Abadhs com objetivo de contribuir na construção de materiais pedagógicos acessíveis que auxiliem o processo de ensino-aprendizagem de estudantes com e sem deficiência.