Especialistas defendem em live: é preciso acreditar que todas as pessoas aprendem

Com mediação de Katia Cibas (IRM), Raquel Franzim e Liliane Garcez, coordenadoras do MEC, debatem a organização do atendimento educacional especializado (AEE) na escola de tempo integral

“A gente não pode ter dúvidas sobre a capacidade das crianças de aprender e se desenvolver. Nós, professoras e professores, sabemos das dificuldades e dos desafios, mas também sabemos que ter altas expectativas sobre as crianças é algo transformador. Quando achamos, por qualquer razão, que um estudante não vai aprender, ele não aprende mesmo. Por isso, apostar na trajetória escolar de todas as crianças é fundamental.”  

A fala é de Raquel Franzim, coordenadora-geral de Educação Integral e Tempo Integral do Ministério da Educação (MEC), durante a live promovida pelo Instituto Rodrigo Mendes (IRM) na última terça-feira (20), para debater o tema Como organizar o atendimento educacional especializado (AEE) na escola de tempo integral?, ao lado de Liliane Garcez, coordenadora-geral de Estruturação do Sistema Educacional Inclusivo do MEC.

O encontro, mediado por Katia Cibas, coordenadora de Formação do IRM, foi o primeiro de uma série de quatro lives que serão realizadas entre maio e setembro. “O objetivo é fomentar o debate e compartilhar experiências que contribuam para a construção de políticas e práticas educacionais inclusivas em diferentes contextos escolares”, explica Katia. A iniciativa faz parte das ações do projeto “Alavancas para a educação inclusiva de qualidade”, do IRM, em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Movimento Bem Maior, o Instituto Ambikira e o apoio do Instituto Machado Meyer (saiba mais sobre a iniciativa ao final do texto). A realização das lives também conta com o apoio da Coalizão Brasileira pela Educação Inclusiva. 

Uma das principais questões discutidas por Raquel e Liliane Garcez foi o direito de todas as pessoas à Educação Integral e à Educação Inclusiva. “É importante começar este debate enfatizando que não há qualquer impedimento para que estudantes com deficiência estejam matriculados na Educação Integral de Tempo Integral”, reforça Raquel. 

Ela ressalta que esse direito é assegurado por marcos legais como a Constituição Federal, a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), o Plano Nacional de Educação (PNE) e a lei atual do Programa Escola Integral. “Não há impedimento, o que há é uma necessidade dos sistemas de ensino e dos projetos políticos pedagógicos se transformarem, porque um direito não é mais importante do que o outro. Os direitos coexistem. A criança que está na escola tem direito a tudo isso e mais. Portanto, esses direitos não podem brigar, não podem ser uma escolha de o sistema estar no AEE ou estar na oferta de tempo integral”, diz a coordenadora-geral de Educação Integral e Tempo Integral.

De acordo com as especialistas, o fato de ainda haver muitas dúvidas sobre como articular o AEE na Educação Integral em Tempo Integral foi o que motivou o MEC a publicar, no final de 2024, o Ofício nº 1379/2024/DPDI/Seb/Seb-MEC, que visa sanar essas questões.    

Essa articulação exige um forte envolvimento das redes de ensino e das escolas. Para isso, é preciso ir além do acesso e garantir as condições de permanência, aprendizagem e conclusão para todos os estudantes. “Não é só estar na escola. É estar na escola com um projeto político pedagógico integral, em que o desenvolvimento pleno — físico, emocional, social, cognitivo, político — seja para todas as crianças, e não só para algumas, independentemente do laudo. Para isso, os sistemas precisam mudar, porque da forma como estão hoje, a gente pode ter crianças passando de uma etapa a outra sem aprender”, enfatiza Raquel.  

Para Liliane, que concedeu entrevista ao DIVERSA sobre esse tema, o benefício da Educação Integral é justamente valorizar todas as formas de ser, estar e viver. Já o do AEE é tornar o currículo acessível por meio de diferentes estratégias pedagógicas, “aproveitando os tempos educativos que são propostos na Educação Integral, os espaços, os materiais, os recursos, introduzindo a ideia de tecnologia assistiva — que é bem diferente de desenvolver currículos específicos para determinada parcela do público-alvo da Educação Especial”.  

Ela destaca ainda que a oferta do AEE deve ser sempre compreendida como complementar ou suplementar, nunca substitutiva à escolarização. E que, portanto, esse serviço é um direito que deve ser garantido a todos os estudantes público-alvo da Educação Especial que precisam dele. Sua oferta é transversal a todas as etapas e modalidades da Educação Básica.  

Ao lembrar que o papel do AEE é garantir o acesso ao currículo, Liliane argumentou que o país é diverso, são mais de 5,5 mil redes de ensino. E por mais que cada secretaria de educação estabeleça suas próprias diretrizes, cabe a cada escola, a partir das diretrizes da sua rede, organizar seu projeto político-pedagógico para dar conta do seu contexto e dos estudantes ali matriculados. Para ela, o AEE deve estar a serviço de garantir o acesso a todas as atividades escolares e a participação plena da criança, do adolescente e do jovem.  

“Desde 2008, isso está posto na Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI), mas, se eu percebo que o AEE faz parte do projeto político-pedagógico da escola, eu começo a repensar como ele vai se organizar dentro da perspectiva do tempo integral e como mais uma atividade pedagógica que pode e deve ser disponibilizada para as crianças que dele necessitam”, ressalta Liliane.  

Durante o encontro, Raquel e Liliane também reforçaram o pedido para que as redes de ensino de todo o país estejam atentas às ações que estão sendo desenvolvidas pelo governo federal para fortalecer a Educação Integral e a Educação Especial na Perspectiva Inclusiva. Entre as ações destacadas está o Programa Dinheiro Direto na Escola Equidade (PDDE Equidade), com inscrições abertas até o dia 6 de junho.  

Uma das frentes do PDDE Equidade é apoiar escolas brasileiras por meio da transferência de recursos financeiros para aquisição de materiais pedagógicos, equipamentos multifuncionais e tecnologias assistivas voltados a realização do AEE prioritariamente nas salas de recursos multifuncionais (SRM), para os estudantes público-alvo da Educação Especial.  

O próximo encontro será no dia 17 de junho e discutirá o tema “Educação indígena e quilombola”. Confira a primeira live disponível no canal do IRM no YouTube.

Alavancas para a educação inclusiva de qualidade     

O projeto “Alavancas para a educação inclusiva de qualidade” é uma iniciativa do Instituto Rodrigo Mendes (IRM), em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Movimento Bem Maior, o Instituto Ambikira e o Instituto Machado Meyer, e visa a formação de educadores, gestores escolares e técnicos de secretarias municipais de Educação de todo o país. O objetivo é potencializar práticas e políticas públicas locais que proporcionem uma educação de qualidade para todas e todos.      

Dividido em diferentes etapas, que vão de 2023 a 2025, o programa é realizado em parceria com dez secretarias municipais de Educação, que representam as cinco macrorregiões do Brasil: Maués (AM), Óbidos (PA), Campo Formoso (BA), Gado Bravo (PB), Irauçuba (CE), Lucas do Rio Verde (MT), Cajati (SP), Patos de Minas (SP), Alvorada (RS) e Canguçu (RS).        

Em 2023, a equipe do IRM conduziu uma formação semipresencial com cerca de 400 educadores desses municípios, que incluiu orientação e apoio para a elaboração e o desenvolvimento de cem projetos inclusivos, com foco na promoção do protagonismo e da autonomia de todos os estudantes (confira alguns desses projetos aqui).

No ano passado, as ações formativas do projeto “Alavancas” tiveram como público-alvo técnicos das secretarias municipais de Educação. O objetivo era que, ao final do percurso, cada rede elaborasse uma política pública voltada à educação inclusiva.    

Em 2025, está previsto o monitoramento das políticas elaboradas e uma pesquisa sobre os impactos gerados pelas formações, além de dois cursos que serão disponibilizados na plataforma de formação do IRM. 

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