Há quem pense que o trabalho de um diretor escolar se resume a preencher formulários, assinar documentos, ir a reuniões, controlar verbas, delegar funções e tarefas; enfim, gerir toda a burocracia da escola. Mas ser diretor é muito mais do que isso. Considerando o atual desafio de escolas públicas e privadas quanto à inclusão de todos os diferentes estudantes nas salas de aula comuns, é preciso pensar no papel do diretor dentro dessa perspectiva.
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Ouvimos relatos sobre escolas onde a direção lança mão de estratégias “mirabolantes” para impedir o ingresso de alunos com deficiência nas turmas. Mas pouco se fala sobre as indispensáveis ações desses gestores para a promoção e garantia da inclusão. A partir da compreensão de que garantir o acesso, a participação e a aprendizagem de todos implica transformar a cultura da escola, ou seja, os seus valores e o modo como ela se organiza, o diretor passa a ser uma figura central no processo inclusivo.
Gestão democrática
Obviamente, o diretor sozinho não conseguirá garantir que a inclusão seja de fato o referencial de todas as ações da escola. Aliás, uma das condições fundamentais para a efetivação da proposta inclusiva em qualquer contexto é a participação direta de todos os envolvidos, inclusive representantes da comunidade.
Dentro disso, a democratização da gestão se revela como estratégia importante para que a instituição de ensino se torne de fato inclusiva. A ideia é desafiadora, pois uma das maiores dificuldades em ambientes de trabalho é lidar com as diferenças para execução de ações pensadas coletivamente.
Nesse sentido, o exercício para a democratização da gestão é justamente o exercício da inclusão: todos, juntos, aprendendo a valorizar as diferenças e, assim, fazendo a diferença.
Diretor como promotor do diálogo
Quando o diretor reconhece a potência da experiência de interação entre todas as diferenças para o desenvolvimento da escola como um todo, “vira-se uma chavinha”, ou seja, uma nova perspectiva é de fato entendida e aceita.
Os desdobramentos diretos disso podem ser a elaboração de: um projeto político pedagógico (PPP) centrado nos princípios da inclusão; um currículo flexível, em que todos se reconhecem e são protagonistas do próprio processo educacional; estratégias pedagógicas diversificadas pautadas na singularidade de cada um, com foco em suas potencialidades e para o pleno desenvolvimento de todos, sem exceção.
Para que tudo isso aconteça, uma iniciativa fundamental que cabe à gestão é estabelecer estratégias que possibilitem o diálogo entre os diferentes atores que compõem o universo escolar. Também cabe a esse diretor pensar em diferentes espaços e momentos que possibilitem o encontro e a troca entre a equipe da escola e a família, entre professores, entre profissionais não docentes etc.
AEE e valorização das diferenças
O profissional do atendimento educacional especializado (AEE) pode ser um importante parceiro nesse processo, considerando a natureza desse serviço de apoio. Apesar de atender somente aos alunos público-alvo da educação especial, a contribuição do AEE na escola pode ser muito mais abrangente. As estratégias desenvolvidas para alunos com deficiência podem servir para o ensino-aprendizagem e a participação dos demais estudantes. Isso mostra que, priorizando a educação inclusiva, a direção escolar agrega benefícios a todos da instituição.
Ou seja, a questão não é só discutir casos específicos, como se a diferença fosse um “privilégio” de somente alguns alunos. Afinal, a inclusão não tem a ver somente com pessoas com deficiência. Vale lembrar que ela também está relacionada às diferenças étnicas, sociais, culturais, regionais, de gênero etc. Enfim, com todos que compõem o universo da escola.
Em suma, valorizar as diferenças beneficia não somente aqueles que foram historicamente excluídos dos espaços de aprendizagem, mas também traz melhorias a todos nós para que, juntos e colaborativamente, superemos a expectativa da homogeneidade e acreditemos que todos podem aprender e reconstruir a escola.
Patrícia Baptista Sargaço é pedagoga com especialização em educação especial. Já foi diretora escolar e professora de atendimento educacional especializado (AEE). Atua como facilitadora de cursos para a formação de professores em diferentes regiões de São Paulo. Atualmente é assistente de direção na EMEF Vianna Moog.
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