Circuito de brincadeiras inclusivas prepara crianças para o esporte

Separadas apenas por uma ponte de concreto, a Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Professora Rosangela Rodrigues Vieira e o Centro Educacional Unificado (CEU) Quinta do Sol foram inaugurados em 2008, na zona leste da cidade de São Paulo (SP). Mas, apesar de serem parte de um mesmo complexo, uma unidade desconhecia o trabalho da outra. Esse isolamento só começou a ser vencido com nossa participação no curso Portas abertas para a inclusão, do Instituto Rodrigo Mendes, em 2015. Durante a formação, as duas instituições foram desafiadas a construir coletivamente um projeto para que os estudantes se apropriassem do CEU e para que o centro contasse com o apoio dos educadores da escola. Assim, nasceu o circuito do brincar, que envolveu 120 crianças com e sem deficiência em brincadeiras preparatórias para o esporte.

O vídeo está disponível com recursos de acessibilidade em Libras e audiodescrição.

A EMEF Professora Rosangela Rodrigues Vieira oferece ensino fundamental e educação de jovens e adultos (EJA) para cerca de 1.200 alunos em três períodos. Desse total, 37 têm alguma deficiência e recebem atendimento educacional especializado (AEE). Por concentrar a maior parte desse público, desenvolvemos nosso projeto com os estudantes do 1º ano. Entre eles havia crianças com Síndrome de Down, paralisia cerebral e transtorno do espectro autista (TEA).

As atividades tinham como proposta desenvolver o potencial dessas meninas e meninos a partir de suas singularidades. Além da prática das brincadeiras, o projeto também incluiu a realização de encontros formativos sobre educação inclusiva com a comunidade escolar. Com textos, filmes e relatos de caso, procuramos conscientizar os professores da unidade sobre a importância de planejar ações que contemplem a todos.

 

Circuito de brincadeiras

As atividades que compunham o circuito foram escolhidas por prepararem as crianças, de forma lúdica e divertida, para a prática esportiva. Foram realizados quatro tipos de brincadeiras (de roda, com estafeta, recreativas e de dança) em diferentes estações espalhadas por espaços das duas instituições. A equipe do centro já costumava trabalhar nesse formato durante as férias escolares e colecionava experiências positivas — o desafio estava em estender as atividades aos alunos da escola.

As estações realizadas foram as seguintes:

Duas garotas correm em uma quadra esportiva, lado a lado, cada uma segurando uma ponta de uma folha de jornal.
Na estafeta com papel, prevaleceu a cooperação ao invés da competitividade. Foto: Pat Albuquerque.
• Brincadeiras de roda: sentados no chão, os estudantes foram estimulados a brincar de “batata quente”, “passa anel”, “telefone sem fio”, “elefante” e “minha tia de Marrocos”. Essas atividades incentivaram o respeito ao tempo do outro, o estreitamento de laços e melhoraram a coordenação motora, a noção de ritmo e as aptidões linguísticas das crianças.

• Jogos de estafeta: alternando materiais, foram executadas diferentes brincadeiras de estafeta:

1) Com arco: os alunos correriam até uma marcação na quadra, onde pegavam o bambolê do chão, passavam-no pelo corpo e voltavam para o final da fila de sua equipe. Era permitido passar o arco tanto de cima para baixo quanto de baixo para cima.

2) Com papel: em duplas, as meninas e meninos corriam até um determinado ponto, segurando um jornal, cada um por uma ponta. O desafio era não deixar a folha rasgar. Nessa modalidade, a cooperação substituía a competição e se um jogador corresse mais rápido do que seu colega e rasgasse o papel, o educador parava o exercício e os orientava.

3) Com sinos ou chocalhos: em equipes, eles corriam até uma determinada distância, tocavam um sino ou chocalho e retornavam.

4) Acerte a bola: organizados em duas equipes, os estudantes se posicionavam em filas nas extremidades da quadra, uma de frente para a outra. O objetivo era arremessar bolas de vôlei em uma bola de basquete colocada ao centro, empurrando-a para o campo adversário.

5) Entrega de jornal: as crianças corriam com uma página de jornal aberta na região do tórax. Sem usar as mãos para segurá-la, faziam o percurso e retornavam, entregando a folha para o próximo colega de time. Se o papel caísse, os alunos voltavam para a posição inicial para recomeçar a brincadeira.

• Recreação: na terceira estação, os alunos foram incentivados, primeiro, a brincar livremente com cordas, petecas e bambolês. Depois, faziam atividades sugeridas pelo professor. As atividades exercitaram a força, o reflexo, a resistência, a flexibilidade, a agilidade e o equilíbrio das meninas e meninos.

• Dança: os estudantes se movimentaram e criaram coreografias ao som de variados ritmos musicais, sob orientação do docente. A proposta era trabalhar o condicionamento físico, o sistema cardiorrespiratório e a expressão corporal.

Por fim, o circuito de brincadeiras foi encerrado na piscina do CEU, local que até então era somente visto de longe pelas crianças da escola. Usando pranchas e boias, elas praticaram respiração, flutuação, propulsão e imersão.

 

Envolvimento das equipes e flexibilizações

Todos os professores de 1º ano, bem como os integrantes do grêmio estudantil, auxiliaram na execução das brincadeiras. Em grupos, os alunos se revezavam entre as estações, que tinham duração de 30 minutos cada. Na escola ocorreram as atividades de roda; já no ginásio do CEU – que envolvia a quadra, um mezanino e a piscina – foram realizados os exercícios de estafeta, de recreação, de dança e a natação.

Estudantes em fila arremessam bolas de vôlei em uma bola de basquete colocada no centro da quadra.
Na brincadeira “acerte a bola”, o objetivo era empurrar a bola de basquete para o campo adversário. Foto: Pat Albuquerque.
Como última estratégia do projeto, registramos o processo das meninas e meninos nos campos físico, cognitivo e sinestésico para que as informações possam ser revisitadas, reorganizadas e ressignificadas, orientando novas ações no futuro. Nosso estudante com deficiência múltipla, Síndrome de Down e com suspeita de autismo, que era avesso ao barulho à e agitação, foi incentivado a participar das atividades com auxílio dos educadores. Quando não se sentia mais à vontade para executar os movimentos, ele seguia na roda, mas somente observando. Conforme nos relatou sua mãe, após participar do circuito, ele parou de se isolar e começou a demonstrar empolgação para brincar ao ver outra criança.

Acreditamos que a empreitada foi um sucesso. As famílias colaboraram durante todo o processo e os profissionais do CEU Quinta do Sol já nos perguntam quando começaremos uma próxima edição. Por isso, temos a intenção de continuar e melhorar o circuito de brincadeiras no próximo ano.

 

Projeto participante do curso Portas abertas para a inclusão. Esta experiência faz parte da Coletânea de práticas 2015.

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