Projeto reproduz em 3D monumentos históricos da cultura afro-brasileira

Voando pelas narrativas invisíveis pretende desenvolver materiais pedagógicos acessíveis para dar visibilidade à história afro-brasileira em sala de aula 

Você já imaginou levar para sala de aula para trabalhar com os estudantes uma miniatura da escultura de Zumbi dos Palmares? Ou de uma igreja com grande importância histórica para o Brasil? Foi essa intenção que me inspirou a abraçar o projeto “Voando pelas narrativas invisíveis”, que pretende dar visibilidade a monumentos da cultura negra, por meio da reprodução em 3D de patrimônios históricos brasileiros.

 

Imagem Largo da Memória, monumento histórico de São Paulo. O monumento é composto por um obelisco no centro de uma base de cinco lances de escada. Fim da descrição.
Largo da Memória, localizado na cidade de São Paulo. Foto: Cecília Bastos/USP Imagem

Sou professor e colaborador do laboratório maker do Centro Universitário São Judas Tadeu (Unimonte) e pesquisador da educação na Universidade Católica de Santos (UNISANTOS).  A ideia do projeto surgiu da necessidade de apoiar educadores e escolas com a produção de materiais pedagógicos acessíveis, com o uso de recursos tecnológicos, que representem valor patrimonial para a cidade de São Paulo.

Descolonização do currículo

O objetivo, além de dar suporte de recursos aos professores de modo que todos os estudantes possam ter acesso aos modelos, incluindo crianças com deficiência visual, é apontar para discussões relacionadas a uma reflexão curricular.

Durante muito tempo, houve uma lógica de esquecimento da cultura afro-brasileira e indígena. O recurso pedagógico, como os que pretendemos desenvolver, dá aos professores a oportunidade de explorar os componentes curriculares ligados à cultura afro-brasileira e serve de indutor para a análise das ações e práticas pedagógicas relacionadas à temática.

O ato de resgatar e produzir modelos 3D relacionados à história do Brasil conecta saberes e dá a oportunidade de ressignificar conteúdos curriculares nem sempre apresentados de maneira ampla.

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Cultura negra

O projeto foi aprovado recentemente em edital do BNDES/Benfeitoria e propõe, na primeira etapa de execução, abordar os seguintes patrimônios culturais de São Paulo: Mãe preta, Zumbi dos Palmares, e Largo da memória.

 

Imagem do monumento "Mãe preta": mulher sentada amamenta bebê. Ela está enrolada em um tecido e seus seios estão descobertos. Fim da descrição
Monumento “Mãe preta”, localizado no Largo do Paissandu, na cidade de São Paulo. Foto: Eugenio Hansen

Todos esses espaços são importantes para a memória da cultura negra na cidade de São Paulo, mas passaram por um processo de apagamento histórico. Nossa ideia é justamente levar essas questões para a sala de aula, com a produção e disponibilização de materiais acessíveis para todos os estudantes.

O que serviu como uma das inspirações foi minha participação na “Volta Negra”, promovida pela Cartografia Negra. Eles realizam um trajeto dos principais pontos históricos relacionados à cultura negra na cidade de São Paulo, explicando a importância de cada lugar.

Por exemplo: você conhece a Capela dos Aflitos, no bairro da Liberdade? Ela, que inicialmente estava dentro do Cemitério dos Aflitos, foi utilizada como abrigo de escravos (vale conhecer a história de Chaguinhas). Muitos deles eram levados para a forca, que se localizava na Praça da Liberdade. A Praça, por sinal, recebe esse nome em razão de inúmeros episódios relevantes para a cultura afro-brasileira.

Ou ainda: você já ouviu falar no primeiro sistema hídrico da cidade de São Paulo? O Chafariz Tebas que se localizava no Largo da Misericórdia foi construída por Joaquim Pinto de Oliveira, o Tebas, uma pessoa que foi escravizada e que teve seu título de arquiteto reconhecido somente neste século. Tebas, dentre muitas obras do sec. XVIII, também foi o construtor da primeira torre da antiga catedral da Sé.

Metodologia

A metodologia de trabalho consiste na identificação de monumentos e edificações de relevância história pelas cidades; voo de drone sobre o patrimônio; digitalização das imagens formando um modelo digital; impressão 3D do modelo; disponibilização dos arquivos abertamente na internet; e entrega dos monumentos para escolas.

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O grupo que está trabalhando comigo é bastante diverso, formado por um arquiteto, designer, fotógrafo e engenheiro de computação.  Nossa ideia é utilizar voos de drone para mapear as áreas e possibilitar a criação de modelos para impressões 3D.

É importante ressaltar que todo material desenvolvido é baseado no princípio do designer universal: tudo que produzimos é imaginado para que todos possam utilizar, não apenas os alunos com deficiência.

Crowdfunding e hackitivismo

Qualquer pessoa pode apoiar o projeto por meio da página de financiamento coletivo e ter acesso a palestras, tecnologias, metodologia e a recompensas pedagógicas propostas pelos profissionais. Nós doaremos para algumas escolas públicas e coletivos os modelos produzidos ao longo do projeto.

Cartaz da campanha do projeto: ilustração de um drone que sobrevoa prédios iluminando os dizeres: "voando pelas narrativas invisíveis". Fim da descrição.

Todos os arquivos produzidos serão disponibilizados na web de maneira totalmente livre e sem custos, de forma que qualquer pessoa com uma impressora 3D poderá utilizá-los.

Dessa forma, educadores e estudantes terão acesso todo o conteúdo desenvolvido. Para a utilização de equipamentos de tecnologia 3D, eles podem buscar parcerias em espaços voltados para o movimento maker. Na cidade de São Paulo, por exemplo, há laboratórios públicos, como os FabLabs Livres, para uso gratuito de educadores.

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