Minha aproximação das reflexões a respeito do legado social relacionado às Olimpíadas e Paralimpíadas, que em 2020 acontecerão em Tóquio, no Japão, foi um desdobramento natural a partir de um projeto que venho desenvolvendo desde 2013. Na ocasião, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) me convidou para pensar sobre uma iniciativa que pudesse aproveitar o momento da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos no Brasil para incentivar as escolas a repensarem a educação física.
Como sabemos, essa disciplina ainda é muito pautada pela competição e pelo alto desempenho. Isso faz com que muita gente seja excluída. Quem nunca foi ou testemunhou alguém sendo deixado de fora numa prática esportiva? A proposta do UNICEF era mudar essa visão a partir da premissa de que todo estudante deveria participar, se desenvolver e se divertir.
Portas abertas para a inclusão
Como resultado, criamos o curso de formação Portas abertas para a inclusão – Educação física inclusiva, que tem sido frequentado por educadores das cinco regiões do país. Cada participante assume o compromisso de criar aulas que viabilizem a interação de todos. O projeto é financiado pela Fundação FC Barcelona e já impactou diretamente mais de 150 mil pessoas por meio de ações que englobam práticas pedagógicas, atividades de gestão escolar e políticas públicas inclusivas.
Essa ação é um exemplo concreto de legado positivo gerado pelos megaeventos realizados em nosso país. Por conta dele, acabei me envolvendo bastante com as Olimpíadas do Rio. Tive a alegria de conduzir a tocha olímpica e, no final do ano passado, fui para o Japão a convite do Fórum Econômico Mundial para participar de um seminário.
O objetivo do evento era discutir como as próximas Olimpíadas podem ampliar o seu impacto social. Na ocasião, dividi o palco com membros do comitê dos jogos em 2020 e, ao final do debate, a mediadora me perguntou: “Rodrigo, o que você acha que Tóquio pode mudar nesse sentido?”
Resumindo minha resposta, penso que a criação de um espaço específico para atletas com deficiência foi uma conquista histórica do movimento mundial em busca de garantia de direitos para tais pessoas. Indiscutivelmente, tem propiciado uma projeção global do tema, colaborando para tirá-lo da invisibilidade.
No entanto, a separação completa dos jogos, entre Olímpicos e Paralímpicos, vai na contramão da ideia de uma sociedade inclusiva. Que mensagem transmitimos ao mundo segregando os atletas pelo fato de terem, ou não, uma deficiência? Além disso, o ato de se apagar a pira Olímpica e, depois de algumas semanas, se acender a pira Paralímpica, só reforça essa mensagem negativa.
Uma única chama em Tóquio 2020
Em 2006, a Organização das Nações Unidas publicou a Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência, documento que define diretrizes internacionais sobre esse segmento da população, hoje representado por cerca de um bilhão de pessoas.
Uma das premissas dessa Convenção é a convicção de que não devemos mais tolerar qualquer tipo de discriminação baseada nas diferenças humanas. Mais de 150 países assinaram esse tratado, assumindo o compromisso de respeitar seus princípios e implementar medidas que viabilizem a construção de uma sociedade inclusiva e igualitária.
Considerando que as Olimpíadas são o maior evento do mundo e que suas cerimônias são vitrines para bilhões de pessoas, gostaria de reforçar minha proposta para Tóquio. Mudanças na história pedem símbolos. Proponho, então, que usemos a mesma tocha, a mesma pira e, o mais importante, que mantenhamos a chama acesa entre os dois jogos. Só assim, a chama Olímpica vai avançar na magnitude de seu papel de representar a igualdade entre os seres humanos. Sonhemos com uma única chama em 2020: #OneFlameTokyo2020.
Confira o vídeo do TEDx São Paulo onde Rodrigo lançou essa ideia:
Rodrigo Hübner Mendes é fundador do Instituto Rodrigo Mendes, organização que desenvolve programas de educação inclusiva. É mestre em administração pela Fundação Getulio Vargas (EAESP), membro do Young Global Leaders (Fórum Econômico Mundial) e Empreendedor Social Ashoka.
Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo em 16/11/2017 e disponível em bit.ly/uma-so-chama.
© Instituto Rodrigo Mendes. Licença Creative Commons BY-NC-ND 2.5. A cópia, distribuição e transmissão dessa obra são livres, sob as seguintes condições: creditar a obra como de autoria de Rodrigo Hübner Mendes e licenciada pelo Instituto Rodrigo Mendes e DIVERSA.