A “invisibilidade” na área da Deficiência já se tornou uma velha conhecida. As pessoas com deficiência a sentem na pele, nas mais diversas situações; os que estão perto delas ou trabalham na área têm histórias para contar.
Para Harry Potter e seus amigos, a invisibilidade trazia vantagens e, portanto, era desejável: com a capa mágica, podiam se aventurar, descobrir segredos e identificar vilões. A capa os protegia, dava acesso a informações preciosas ou até mesmo favorecia escapadelas.
Não é esse o caso das pessoas com deficiência.
Já que repetimos essa afirmação e até comprovamos sua ocorrência, vale a pena refletir um pouco.
Mas por que usar o plural?
Acho que há dois tipos de invisibilidade.
O nosso conhecido é aquele que ignora as características das pessoas com deficiência, “camuflando-as” com frases como “Para mim, todos são iguais”; “O que me interessa são pessoas”; “Trato todos do mesmo jeito” ou variações em torno deste tema.
Essas frases, aparentemente louváveis, podem trazer perigos ou preconceitos embutidos, que talvez não sejam percebidos, pois as intenções são as melhores possíveis.
Mas, perigo? Como assim?
Ele reside na não consideração de características que fazem parte da pessoa com deficiência: ignorar a necessidade do intérprete de Libras; de ter rampa, elevador, piso podotátil, audiodescrição ou texto com português simplificado e ilustrações, entre outras.
Como alerta Reinaldo Bulgarelli, As pessoas não são “alminhas”; têm corpo, características, desejos e necessidades, que formam sua identidade. Quando esta não é sequer vista ou considerada em nome de uma suposta “igualdade”, as pessoas se tornam “invisíveis”, porque algumas de suas características são solenemente ignoradas. Aí, a presença nos espaços sociais se torna difícil ou até mesmo inviável, para muitas.
Isso explica porque nem sempre são vistas nas ruas.
Esse tipo de invisibilidade deve ser combatido, sempre. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que o Brasil ratificou com equivalência de emenda constitucional é o instrumento mais potente que dispomos.
Ela traz um novo olhar, tendo como base os Direitos Humanos. Um de seus pilares é a Acessibilidade, em todos os seus significados. A ausência de acessibilidade configura discriminação – e discriminar é crime. Simples assim.
Ana Paula Crosara, que tinha uma deficiência física, costumava dizer que esperava o dia em que entrar e sair de um carro fosse corriqueiro, deixando de ser “um espetáculo”, que atraía a atenção de transeuntes.
Há, então, outro tipo de “invisibilidade” – esse, sim, desejável, pois indica que as condições para que as pessoas com deficiência possam estar na sociedade foram contempladas. Elas então “aparecem” e podemos conviver com naturalidade, segurança e respeito.
Esse círculo virtuoso, que beneficia a todos, traz uma “invisibilidade” desejável – justamente porque considera a diversidade funcional de cada um. Para termos direitos iguais, nossas diferenças precisam ser vistas e reconhecidas.
Marta Gil é socióloga, consultora na área da Deficiência, coordenadora do Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas, Fellow da Ashoka Empreendedores Sociais, colaboradora do SENAI-SP e do Planeta Educação.
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