Preconceito: o avesso do conhecimento

Desde a antiguidade clássica as concepções de política, de justiça, de subjetividade, de direitos sociais, dentre outras, têm sido transformadas. O advento da moeda, da fé religiosa, da solidariedade, do capitalismo, dos tratados internacionais acerca dos direitos humanos… imprimiu (e imprime) marcas que moldam a vida social em uma determinada época e lugar.

No tocante ao âmbito educacional, podemos dizer que os modos de funcionamento das instituições educacionais nem sempre estiveram pautados no que hoje em dia se convencionou chamar de cidadania e respeito ao próximo. Por exemplo, no Brasil, a escola foi instituída no século XIX, no contexto da escravização. Naquela época, só alguns poderiam frequentá-la.

Contemporaneamente, o estado brasileiro criou marcos regulatórios que versam sobre a igualdade de direito a todos os cidadãos. A Constituição brasileira, no art. 3º, inciso IV, estabelece como um dos objetivos fundamentais da República “a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Nesse mesmo sentido, o art. 205 da Constituição preconiza uma educação que prepare o sujeito para o exercício da cidadania. (Brasil, 1988)1.

A sociedade e o estado brasileiro têm criado ações voltadas para a promoção de igualdade como um dos direitos matriciais para a vida em sociedade. Por assim dizer, são iniciativas que buscam romper situações sociais de cunho preconceituoso e discriminatório.

O preconceito ocorre onde há desigualdade de poder. Diz respeito a uma valoração estereotipada, generalizada e negativa atribuída ao outro, àquele considerado diferente e inferior. Trata-se, assim, do avesso do conhecimento. Em maior ou menor grau e por caminhos diferentes, ele afeta o repertório intelectual e afetivo do preconceituoso e daquele exposto a essa modalidade de violência. É possível dizer que o preconceito dá ensejo para que o sujeito aja de forma discriminatória. Ambos, preconceito e discriminação, trincam os princípios modernos fundantes da vida social. São eles: igualdade, liberdade e fraternidade.

Vivemos em uma conjuntura em que simultaneamente há uma valorização da noção de cidadania e, na contramão, uma deslegitimação de alguns grupos sociais, como é o caso dos homossexuais, dos negros, das mulheres, dos idosos, dos loucos, dos sujeitos com deficiência. Esse cenário de ambivalência não é alheio à escola, sendo sua tarefa debatê-lo.

Uma escola democrática é aquela que prima por uma educação comprometida social e politicamente com um horizonte igualitário, em que alunos e funcionários partilhem não apenas o mesmo teto e o mesmo chão, mas o mesmo direito a um convívio e uma aprendizagem plurais.

1 Brasil, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Recuperado em 12 de maio de 2013, de http://www.planalto.gov.br/ccivil.


Eliane Silvia Costa é Psicóloga, especialista em Saúde Mental e na temática étnico-racial, doutora pelo Instituto de Psicologia da USP (IPUSP), membro do Laboratório de Estudos em Psicanálise e Psicologia Social do IPUSP.

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