Por meio de atividades culturais, estudantes do Parque das Tribos em Manaus aprendem valorização da história e da identidade indígena
Para que crianças e jovens da comunidade Parque das Tribos, em Manaus (AM), tenham acesso à educação e ao fortalecimento da cultura indígena, educadoras têm realizado ações locais que geram conscientização ambiental e valorização das diversas etnias presentes na região.
Uma das iniciativas é a da pedagoga com ênfase em multiculturalidade Ana Claudia Martis Tomás, da etnia Baré. Desde 2015, ela apoia a alfabetização das crianças do Parque das Tribos, recebe jovens e adultos para o ensino da língua nheengatu (variação moderna do tupi) e realiza projetos de artesanato com as mulheres indígenas.
No início, Claudia Baré, como é mais conhecida, teve apoio dos moradores e líderes da comunidade e, em 2016, o trabalho se tornou oficial pela Secretaria Municipal de Educação de Manaus, por meio da criação do Centro Municipal de Educação Escolar Indígena (CMEEI) Wakenai Anumarehit.
Claudia foi nomeada professora indígena do centro e passou a contar com o trabalho voluntário de Vanderlecia (Vanda) Ortega, da etnia Witoto, estudante de pedagogia, nas atividades extracurriculares desenvolvidas com as crianças e jovens da comunidade.
As crianças e a natureza
Paralelamente, Vanda Witoto realiza o projeto Uruê, que promove atividades ao ar livre com as crianças e resgata costumes indígenas e a consciência ambiental, por meio de esportes tradicionais, do cultivo de plantas e frutas típicas e da coleta de lixo das áreas verdes:
Eu trago para dentro das nossas atividades tudo que vem da natureza, porque as escolas tradicionais nos separam desses elementos, então a gente busca se reconectar com eles. Isso é dar valor ao aluno e à história de vida dele. Ao trazer algo de sua realidade, a aprendizagem se torna mais significativa.
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Educação escolar indígena
A estudante de pedagogia explica que o Parque das Tribos possui cerca de sete anos de existência e é ocupado por 90% de famílias indígenas de 35 etnias. Eles não possuem, até o momento, uma escola local para atender as cerca de 200 crianças e jovens indígenas, que precisam frequentar uma escola regular fora da comunidade para ter acesso à educação formal.
De acordo com Vanda, a educação é uma importante ferramenta da autonomia e do reconhecimento de identidade, mas as escolas frequentadas atualmente pelos residentes da comunidade precisam levar em consideração as diferentes etnias, línguas e costumes dos estudantes.
A gente acredita muito na educação! Temos lutado muito para que ela seja uma educação que respeite também todas essas especificidades que existem para diversos povos. Que a educação seja realmente inclusiva para todos e para todas.
Vanda afirma que muito do que foi conquistado até hoje se deve aos esforços voluntários, de membros da comunidade e de organizações da sociedade civil. A maioria dos investimentos é realizada por Claudia e reforça a necessidade de apoio do poder público para melhorias no espaço atual do projeto.
A nossa busca junto ao poder público é a construção de uma escola dentro do Parque das Tribos, para que essas crianças tenham garantido seu direito a uma educação de qualidade.
A origem dos guerreiros
Claudia explica que o nome do CMEEI é uma homenagem a duas crianças do Parque das Tribos que representam a luta, a resistência e a persistência, muito marcados na história dos indígenas.
A tradução de Wakenai é “a origem de um povo”; e Anumarehit, “grande guerreiro”. O nome em português ficou “a origem dos guerreiros”: “é isso que significa o Centro hoje”, explica Claudia.
Desde pequenas, Claudia Baré e Vanda Witoto tiveram dentro de casa, com seus pais, um exemplo de como a educação pode ser revolucionária.
Vanda conta que seu pai, Edson Ortega Vargas, tendo estudado até a 4ª série do ensino fundamental, ensinava o que sabia e alfabetizava os indígenas da Aldeia Colônia, localizada no município de Amaturá (AM). Ele tinha o sonho de terminar os estudos, o que conseguiu em 2017, aos 52 anos, com a Educação de Jovens e Adultos (EJA).
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Já Silvano Tomás, pai de Claudia, se formou em pedagogia e lecionou durante toda sua vida, tendo sido professor municipal de Manaus. Sua atuação é uma referência de resistência para Claudia, e a motivou a propagar a seus estudantes uma mensagem de autoaceitação:
A gente tem que estar onde somos aceitos, onde as pessoas nos respeitam do jeito que nós somos, e nós somos indígenas e vamos continuar sendo indígenas em qualquer lugar.