O papel das pessoas sem deficiência nas ações de inclusão

O termo inclusão chega até você em meio a uma saraivada de informações, seduções e convites ao trato social. Enquanto uma pessoa sem deficiência, você pensa: “olha só, que bacana. Vou entrar nessa, vou ajudar”. No calor da intenção – que costuma ser legitimamente benevolente –, muitas vezes nos esquecemos de fazer perguntas cruciais: “quero ser um agente de transformação. Mas por quê? E para quê?”

A perspectiva inclusiva é resultado de um processo histórico. Nas sociedades primitivas, as práticas eram a do extermínio ou banimento da criança com deficiência. Com o desenvolvimento da relação do ser humano com o divino, o sacrifício e o abandono foram abolidos, mas instaurou-se a ideia de que essas pessoas representavam um “castigo dos deuses” para suas famílias. Outro momento foi o do surgimento do estigma do “coitado de Deus” – da criatura que precisa de nossa misericórdia e pena.

Em meio a todo esse processo, surge a questão: como educar a pessoa com deficiência? Vemos, assim, se abrir o tempo da chamada educação especial. Estigmatizado, ainda não tendo tratamento de fato igualitário, esse público é agrupado por condição em instituições específicas. Surdos vão para as escolas de surdos, cegos frequentam ambientes educacionais de cegos e assim por diante. Permanece o fator excludente: eles estão juntos, mas separados do mais social.

Todo esse movimento nos trouxe ao que hoje temos procurado experimentar: a dita inclusão – que nada mais é do que o esforço para tirar a pessoa com deficiência de todo e qualquer quarto escuro nos fundos do cotidiano. O fazer inclusivo defende que o real avanço se dá com pessoas com e sem deficiência vivendo juntas situações rotineiras. Não mais escolas ou institutos específicos para surdos, cegos ou demais, mas espaços para todos. Salas de aula em que surdos e ouvintes aprendam juntos. Pessoas com Síndrome de Down ou autismo ao lado de quem não possui diagnóstico de déficit cognitivo. Uma utopia? Não. Um experimento mais e mais oportunizado, tentado e instigante.

O convite para atuar na inclusão

Para trilhar esse caminho, há um primeiro passo a ser tomado pela pessoa sem deficiência: recuar de si mesma. Mergulhar em experiências inclusivas buscando benefícios próprios – sejam de que ordem for – pode ser desastroso. Não entendamos o compromisso inclusivo, com isso, como uma ação de irá colocar alguém acima dos demais: assumir para si o lugar de um “benfeitor” apenas reforça a imagem da pessoa com deficiência como eterno coitado. No entanto, não abdicar das necessidades de premiação pessoal representa uma premissa nociva.

Para que aceitar o convite de atuar na inclusão? Qual a finalidade fundamental de se trazer essa atitude social para si? Uma análise do histórico do processo inclusivo pode nos ajudar nessa resposta. Dar fim a esses eternos quartos escuros, no fundo das residências relacionais mais íntimas, parece ser um “para que” extremante urgente. Querer ser um agente inclusivo para alimentar o próprio sorriso de satisfação quando nunca ou muito pouco precisamos lutar por respeito no trato social é causa bem menor perto do compromisso de ajudar o outro a ser respeitado.

Quando o assunto é inclusão, o por que e o para que estão no outro.

 

Carlos Correia Santos é especialista em educação especial com ênfase na inclusão, especialista em educação musical e ensino de artes, psicopedagogo clínico e pós-graduando em musicoterapia.

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