“Não temos que nos acostumar com direitos negados”

Para a coordenadora do Memorial da Inclusão, Elza Ambrósio, devemos apostar em informação sobre os direitos humanos para construir uma cultura inclusiva

“Mostrar que no mundo há espaço para todos”. Assim Elza Ambrósio, coordenadora do Memorial da Inclusão, define os seus mais de 30 anos de dedicação à luta pela efetivação dos direitos da pessoa com deficiência. Para ela, é necessário reivindicar direitos todos os dias e investir na informação para eliminar as barreiras que impedem a participação e inclusão de todos na sociedade.

Elza posa para foto ao lado de exposição de jornais antigos

Direitos humanos e a pessoa com deficiência

Em 2006, a Organização das Nações Unidas (ONU) publicou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, com o objetivo de proteger e garantir o total e igual acesso a todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência.

Em consonância com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção pretende oportunizar a participação da pessoa com deficiência em igualdade de condições em todos os ambientes da sociedade. Desde sua publicação, o Brasil formulou e aprovou leis avançadas para garantir os direitos humanos e reverter o panorama histórico de exclusão social desse público.

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Elza posa para foto sentada em poltrona da exposição permanente do Memorial da Inclusão

Antes do marco legal, as pessoas com deficiência se mobilizaram para terem os seus direitos atendidos. Elza participou dessas ações: integrante do movimento social da pessoa com deficiência há mais de 30 anos, fez parte da fundação do Centro de Documentação e Informação do Portador de Deficiência (CEDIPOD) e atua desde a década de 90 como técnica de acessibilidade na web, produzindo sites acessíveis.

“Aqui a gente incentiva os reclamadores”

Nos últimos 10 anos, ela é coordenadora do Memorial da Inclusão: os caminhos da Pessoa com Deficiência, órgão da Secretaria de Estados dos Direitos da Pessoa com Deficiência que pretende conscientizar os diversos setores da sociedade sobre questões, potencialidades e direitos das pessoas com deficiência.

O Memorial possui uma exposição permanente que agrupa documentos históricos de personagens e eventos que marcaram o Movimento Social e Político das Pessoas com Deficiência, em defesa de seus direitos no contexto amplo dos direitos humanos.

Dia Nacional dos Direitos Humanos

Desde 2012, o Dia Nacional dos Direitos Humanos é comemorado em 12 de agosto. A data faz memória à defensora dos trabalhadores rurais Margarida Maria Alves. Ela foi assassinada durante a ditadura e inspira a Marcha das Margaridas, que reúne camponesas em favor de igualdade, autonomia e liberdade para as mulheres, levantando pautas feministas e em defesa das pessoas do campo.

Confira a entrevista que o DIVERSA realizou com Elza Ambrósio para o Dia Nacional dos Direitos Humanos:


DIVERSA – Qual a importância do Dia Nacional dos Direitos Humanos? E qual a relevância do Memorial da Inclusão neste dia?

Elza – Falar de Direitos Humanos é nossa tarefa diária. Quando falamos de acessibilidade e de direitos iguais, estamos falando de direitos humanos o tempo todo. Não deveria ter apenas um dia de comemoração, porque todo dia precisamos cuidar disso e reivindicar direitos. Nesse sentido, acho que estamos caminhando um pouquinho mais rápido do que nas décadas anteriores. Recentemente recebi uma mensagem de um estudante que participou de nossa exposição em Minas Gerais. Ele disse que a nomenclatura que ele encontrou não era a adequada [pois os documentos antigos se referiam a pessoas com deficiência como “deficiente”]. Muitas pessoas reclamam de acessibilidade dos espaços também. E nós ficamos felizes com isso. Nós não temos que nos acostumar com direitos negados. Aqui a gente incentiva os reclamadores.

+ Como chamar as pessoas que têm deficiência?

Como a sociedade civil pode colaborar para a efetivação dos direitos das pessoas com deficiência?

Sempre é via informação. As pessoas que têm informação entendem que não dá mais para discriminar quem quer que seja. Discriminação para mim é sinônimo de falta de informação. Quando se leva informação você de alguma forma está impactando a realidade das pessoas.

Como romper as barreiras atitudinais, comunicacionais e físicas que dificultam a participação social das pessoas com deficiência e consequentemente impactar na qualidade de vida?

Posso citar um exemplo: aqui nós recebemos vários grupos de jovens aprendizes do Metrô de São Paulo para um período de treinamento. E temos um retorno de que o Metrô parou de receber reclamações das pessoas que utilizam o transporte, pois os profissionais foram qualificados para receber bem todas as pessoas.

Aqui no nosso dia a dia nós temos que pregar o que a gente fala. Então, praticamos o “Nada sobre nós sem nós”. Temos cursos de historiadores e antropólogos, mas é imprescindível que tenhamos uma pessoa com deficiência falando dela. E essa troca muda as pessoas: os alunos sempre fazem muitas perguntas e causa um impacto.

Para finalizar, qual seu recado nessa data em termos dos caminhos que devem ser trilhados pela sociedade civil e pelo poder público para a equiparação da participação social entre pessoas com e sem deficiência que constam na nossa legislação, inspirada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência?

Se tivéssemos mais os meios de comunicação juntos conosco e todos os dias víssemos pessoas falando de acessibilidade e de não discriminação, avançaríamos muito e conseguiríamos alavancar nosso sonho de um mundo com oportunidades iguais para todos. Com informação podemos mudar as coisas mesmo com poucos recursos. É isso que a gente faz nos últimos 30 anos: tentar mostrar que no mundo tem espaço para todo mundo.

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