Ao incentivar trabalho colaborativo a partir das situações desafiadoras vividas em sala de aula, responsáveis pela gestão da aprendizagem auxiliam professores a desenvolver ações pedagógicas mais inclusivas
Nas últimas décadas, o foco da educação inclusiva no Brasil foi o de garantir o acesso de crianças, adolescentes e jovens com deficiência à escola comum. Hoje, mais de dez anos após a implementação da política que orienta a educação especial na perspectiva inclusiva, a preocupação dos educadores é garantir o direito à aprendizagem. Afinal, incluir não é só estar no mesmo espaço, mas também possibilitar que todos possam se desenvolver integralmente e ter sucesso escolar.
Segundo Katia Cibas e Regina Mercurio, do Instituto Rodrigo Mendes (IRM), a coordenação pedagógica tem um papel fundamental nessa missão. Conforme as especialistas lembram, os coordenadores são responsáveis por articular os saberes da equipe. Junto a cada professor, ajudam a pensar em atividades para as turmas e, coletivamente, “garantem e mediam a troca e compartilhamento de experiências entre os docentes”.
Assim, para desenvolver ações pedagógicas mais inclusivas, Katia e Regina destacam que é fundamental que os coordenadores articulem as situações desafiadoras vivenciadas por cada professor em sala de aula com os momentos de trabalho coletivo, garantindo a colaboração de todos no processo de inclusão.
Formação contextualizada
Samuel Moreira Barboza atuou como coordenador pedagógico por quatro anos na rede municipal de Poá, na região metropolitana de São Paulo (SP). Atualmente diretor da EMEB Manoel da Silva Oliveira, o pedagogo já contou aqui no DIVERSA um caso de inclusão na educação infantil que vivenciou em 2017.
Leia o relato dessa experiência:
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Para ele, discutir coletivamente as situações relacionadas ao público-alvo da educação especial é uma prática que coloca em xeque estratégias que já não funcionam e expõe as limitações da escola. Um “desconforto” necessário para construir uma pedagogia mais inclusiva e que deve ser mediado pelos coordenadores, “garantindo que todos estejam envolvidos e colaborem de maneira pacífica, professores, alunos, familiares; e buscando parcerias com as áreas de Assistência Social, da Saúde. Quando os atritos são solucionados, a aprendizagem flui”, afirma.
Para Regina, trata-se de oferecer uma formação continuada contextualizada: “Muitas vezes, o coordenador planeja uma atividade para o horário coletivo, cada um faz sua leitura e isso fica descontextualizado daquilo que o professor vive cotidianamente. É importante propor um trabalho coletivo em cima da experiência em sala de aula”.
A partir desse contexto, a coordenação pedagógica pode buscar filmes, textos e outra práticas que estejam ligadas ao que está sendo vivido na escola. No DIVERSA, é possível encontrar relatos de experiência, estudos de caso, artigos e conteúdos explicativos sobre educação inclusiva que podem ajudar coordenadores a investir na formação continuada de seus professores.
Trabalho colaborativo
Como a perspectiva inclusiva prevê a colaboração de todos, os coordenadores são responsáveis por garantir que informações trazidas pelos próprios estudantes, seus familiares, outros profissionais envolvidos e parceiros da escola sejam contempladas nos momentos coletivos. Samuel conta: “Na nossa escola, esses encontros reúnem os professores da sala regular, os profissionais do atendimento educacional especializado (AEE), outros de apoio, tudo em diálogo com as famílias”.
A presença do docente do AEE nas horas de trabalho pedagógico, aliás, é fundamental para superar os desafios encontrados na sala comum. Quando ele participa, pode propor atividades ao colega da sala comum considerando os interesses e as necessidades de cada aluno com deficiência, identificar possíveis barreiras à aprendizagem e apontar estratégias para que o estudante tenha as mesmas oportunidades que toda a turma. “Os coordenadores devem garantir que eles estejam presentes”, afirmam as especialistas do IRM. E, ao trabalhar essas questões coletivamente, as soluções encontradas potencializam a aprendizagem de todos os alunos, com ou sem deficiência.
Na relação com mães, pais ou responsáveis, Katia reforça que cabe à coordenação pedagógica buscar informações sobre a vida do estudante que podem ser úteis para a escola. “Juntar o que a família traz com aquilo que os educadores veem em sala de aula”, reforça. Chamá-los para contar como se comunicam com a criança, o que ela gosta de fazer, o que ela comenta sobre a escola em casa são maneiras de se aproximar dos familiares de modo propositivo.
Nessas conversas, Samuel recomenda que se procure conhecer as particularidades do aluno para propor intervenções de olho nelas. “Todos são capazes e têm o direito de aprender. Para isso, muitas vezes é preciso ir a campo, pesquisar o cotidiano do estudante, conhecer sua história de vida, compreender sua realidade”.
Por fim, o educador de Poá lembra que os coordenadores pedagógicos precisam estar atentos para que professores não criem expectativas de que o laudo médico irá apontar soluções pedagógicas. No caso relatado por Samuel ao DIVERSA, os educadores sentiam-se angustiados porque a família tinha dificuldades em obter um diagnóstico para a criança. Mas após uma mudança de postura da própria coordenação na relação com os pais, a escola percebeu que isso não os impedia de fazer algo.