Uma das discussões mais importantes sobre a educação inclusiva é que ela não pode ser uma prática repetitiva, na qual o planejamento é seguido rigidamente, sem variação, para todos os alunos. Ao contrário, a inclusão na sala de aula implica em oferecer uma proposta ao grupo como um todo, ao mesmo tempo em que atende às necessidades de cada um, em especial àqueles que correm risco de exclusão em termos de aprendizagem e participação na sala de aula.
É no planejamento que se determina o quê, quando e como ensinar. Um plano de aula, ou uma sequência didática pode contemplar regulações organizativas nos objetivos, conteúdos, estratégias, recursos ou na avaliação. Podemos chamá-las de adequações ou flexibilizações (do termo “flexibilidade”, que é qualidade do que é flexível. Cientes de que a ideia de flexibilização vincula-se à necessidade de conceder maior plasticidade, maior maleabilidade, ao que se quer flexionar, destituindo-o da rigidez tradicional).
Leia também:
+ Flexibilizações vs. adaptações curriculares: como incluir alunos com deficiência intelectual
+ Receita de inclusão?
+ Pistas e desejos para uma avaliação inclusiva
Para estruturar as flexibilizações, se faz necessário refletir sobre os possíveis ajustes nas formas de organização didática sem que se torne um plano paralelo, segregado ou exclusivo (que tem poder para excluir). As flexibilizações e/ou adequações inseridas na prática pedagógica devem estar a serviço de uma única premissa: diferenciar os meios para igualar os direitos. Principalmente o direito à participação, ao convívio.
As categorias de um planejamento flexível
Uma das abordagens para um planejamento flexível considera três importantes categorias a serem dimensionadas pelo professor:
1) Complexidade;
2) Quantidade;
3) Temporalidade.
Cada uma delas, ou a intersecção delas, poderá ajustar os objetivos e os conteúdos para garantir a equidade de oportunidades no processo de ensino e aprendizagem. Tanto os objetivos como os conteúdos poderão ser priorizados, complementados ou reajustados desde que contemplem a temática oferecida ao grupo classe. Os mesmos princípios que orientaram a organização dos objetivos e conteúdos servirão para verificação e validação das aprendizagens.
Considerando os conteúdos escolares como objetos da aprendizagem, os alunos constroem significados. O professor tem a função de mediador entre alunos e conhecimentos, facilitando o processo de construção. Deve intervir exatamente nas atividades que o aluno ainda não tem autonomia, oferecendo a ajuda necessária para que se sinta capaz de realizá-la. É nesse contexto dinâmico que o professor seleciona procedimentos de ensino e apoio para compartilhar, confrontar e resolver conflitos cognitivos.
Complexidade
Para que todos tenham acesso ao currículo, o professor poderá dimensionar a complexidade. O currículo não é outro, não está restrito ou selecionado. É preciso, no contexto coletivo, diferenciar atividades ou papéis individuais de modo que cada um encontre sentido, tenha oportunidade e sinta-se constantemente desafiado em seu processo de aprendizagem. Quando necessário, organizar atividades com diferentes formas de apoio: mediação individual, quantidade de tarefas diferenciada, inserção de recursos específicos às necessidades.
Temporalidade
A abrangência da temporalidade refere-se ao tempo que o aluno levará para construir competências e aprender conhecimentos. Também se refere à diferenciação de tempo quanto ao ritmo de trabalho, concentração, mobilidade, ou execução de atividades em diferentes situações na rotina escolar.
Tal abordagem considera a sala de aula como espaço de concretização do projeto que foi anteriormente elaborado nos diversos níveis do sistema educacional. Mas, é principalmente, um espaço de construção e reconstrução do conhecimento, de descoberta do outro e de si mesmo. Se a sala de aula é um contexto de construção, a sala de aula inclusiva exige um rompimento com estratégias e práticas limitadas e limitantes para dar lugar a um espaço de participação com alternativas individuais e/ou colaborativas.
Os princípios de prática colaborativa e agrupamentos produtivos favorecem a cooperação entre os estudantes que se agrupam para resolver desafios e construir conhecimentos juntos. As aulas são organizadas em abordagens didáticas que encorajam a participação diferenciada sobre um mesmo contexto (tema ou conteúdo curricular), se complementam e constroem um conhecimento coletivo.
Mudar a prática pedagógica
A medida de um planejamento para a diversidade (necessidades comuns ao grupo) e para a educação inclusiva (necessidades específicas para alguns alunos) implica em fazer uma avaliação pedagógica cuidadosa, valorizar as potencialidades e não as limitações e dinamizar o currículo. Na prática pedagógica diferenciada, todos os alunos exercitam o enfrentamento dos desafios e a socialização dos conhecimentos com diferentes habilidades e/ou possibilidades.
São práticas que reconstroem um novo sentido para o currículo, destinam-se a todos os alunos e representam uma oportunidade, um objetivo para que a escola gere transformações não só pedagógicas, mas na própria sociedade.
Daniela Alonso é educadora, consultora de projetos educacionais, selecionadora do Prêmio Educador Nota 10 da Fundação Victor Civita, psicopedagoga, especialista em educação inclusiva.
© Instituto Rodrigo Mendes. Licença Creative Commons BY-NC-ND 2.5. A cópia, distribuição e transmissão dessa obra são livres, sob as seguintes condições: Você deve creditar a obra como de autoria de Daniela Alonso e licenciada pelo Instituto Rodrigo Mendes (IRM) e DIVERSA.