Acessibilidade no meio artístico busca garantir que pessoas com deficiência estejam em qualquer parte do espetáculo, não apenas na plateia
“Eu me descobri como pessoa. Eu descobri uma maneira artística de me mostrar na cadeira de rodas”. É assim que a atriz Vanessa Romanelli descreve a sua relação com o teatro.
Bióloga geneticista de formação, ela foi convidada por amigos a acompanhar uma peça do centro Oficina dos Menestréis. Ficou “tão maravilhada” que logo pediu para fazer parte das aulas de teatro do grupo. “Eu me apaixonei e nunca mais saí”, conta.
Desde então, Vanessa interpretou inúmeros personagens, atuando também na novela “Viver a vida”, da rede Globo. Para ela, a relação com o teatro vai muito além da arte: tem impacto em diversas situações de sua vida e nas suas escolhas.
Representatividade no teatro
A mesma visão sobre a importância do teatro é compartilhada por Tabata Contri, atriz que também atuou em inúmeras peças da Oficina dos Menestréis e participou como assistente de direção pelo grupo. A artista se consolidou como sinônimo da luta por representatividade das pessoas com deficiência no teatro. Para ela, a diversidade deve ser valorizada em todos os ambientes da sociedade.
Somos diferentes e sonho ver essa pluralidade representada nas campanhas, nas marcas e no dia a dia das pessoas
Da mesma forma, Vanessa entende que a representatividade em grupos artísticos faz com que ela se sinta mais parte da sociedade. Para ela, não é preciso obrigatoriamente que o teatro levante a bandeira da luta das pessoas com deficiência, mas que garanta a representação desse público em suas peças.
Diversidade no teatro
E essa é a proposta da Oficina dos Menestréis: promover diversidade, acessibilidade e inclusão. O centro oferece formação e apresentações de teatro musical para escolas e grupos corporativos. Em atividade desde 1991, o grupo coloca pessoas com e sem deficiência para contracenaram juntas.
A Oficina possui cursos regulares que qualquer pessoa pode fazer parte, com idade mínima de 14 anos. Além disso, também realiza projetos sociais para atender jovens em vulnerabilidade social e idosos.
Produtora de projetos sociais da oficina, Evelyn Klein explica que o sonho do grupo sempre foi trabalhar com a diversidade. “O teatro é uma arte muito democrática e um potencializador de habilidades”
Na mesma linha, Deto Montenegro, diretor do grupo, entende que o acesso à cultura é um direito universal.
A arte abraça todo mundo. Tem espaço para qualquer pessoa: para o Tim Maia e para o Chico Buarque.
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Acessibilidade cultural
Nos últimos anos, o debate sobre acessibilidade cultural vem se fortalecendo no cenário político e por meio de redes da sociedade civil. A Lei Brasileira de Inclusão (LBI) assegura às pessoas com deficiência o direito à cultura, garantindo o acesso a de conteúdos em formato acessível.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência, como a LBI também ficou conhecida, entende a acessibilidade como um direito que garante à pessoa com deficiência viver de forma independente e exercer seus direitos de cidadania e de participação social.
Para o coordenador da Escola de Gente, Pedro Prata, o Brasil possui um arcabouço jurídico de inclusão social muito positivo, mas é preciso avançar em termos práticos.
O nosso maior desafio é reivindicar a inclusão, a acessibilidade, os direitos das pessoas com deficiência. Assim, vamos transformar as leis em práticas cotidianas
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Luta por teatro acessível
Em 2017, o Congresso Nacional aprovou lei que torna 19 de setembro o “Dia Nacional do Teatro Acessível”. O objetivo é ajudar a divulgar a cultura por meio de atividades cênicas que ofereçam recursos de acessibilidade física e comunicativa a pessoas com deficiência.
A iniciativa surgiu após a campanha “Teatro Acessível: Arte, Prazer e Direitos”, idealizada pela Escola de Gente – Comunicação em Inclusão, organização que tem como propósito colocar a comunicação como instrumento de inclusão social.
Pedro destaca que a ideia da campanha não era apenas viabilizar a acessibilidade na plateia, mas no palco também: “Teatro acessível é garantir que as pessoas com deficiência estejam em qualquer parte do espetáculo: encenando ou participando da produção da peça”.
Espetáculo on-line acessível
Como reflexo da luta por acessibilidade, a Escola de Gente, está buscando promover acessibilidade digital durante a pandemia. Para valorizar a prática teatral, irá apresentar uma peça on-line com tradução simultânea em libras, audiodescrição e legendas. Baseado em livro de Claudia Werneck, o espetáculo “Ninguém Mais Vai Ser Bonzinho” será apresentado no canal do youtube da instituição.
Pedro acredita que a atividade será um “marco da cultura acessível”, sendo um dos resultados que o período de isolamento social acelerou. “Com a pandemia, a gente foi obrigado a pensar em soluções para acessibilidade virtual. E conseguimos!”.