Coautor de estudo de caso sobre educação física inclusiva fala sobre avanços ainda necessários para garantir a plena participação de todas e todos
A luta das pessoas com deficiência precisa abranger todos os grupos da sociedade, alcançando pessoas com e sem deficiência. É o que defende Luiz Conceição, coordenador de formação do Instituto Rodrigo Mendes (IRM).
Sua visão sobre a urgência da luta por inclusão e equidade ganhou força no desenvolvimento de “O Caso de Educação Física Inclusiva”, estudo que mapeou experiências pedagógicas inclusivas pelo Brasil. O estudo foi publicado em 2013 no portal DIVERSA e recentemente no livro “Educação Inclusiva na Prática”, lançado no último ano pelo IRM em parceria com Editora Moderna e Fundação Santillana.
Analisando as conquistas sociais dos últimos anos, Luiz explica que, na época de construção do material, a educação caminhava para deixar uma concepção excludente para trás.
Nesse momento, começa a se desenvolver mais claramente o conceito de educação inclusiva, a partir da educação especial: “A educação inclusiva é uma perspectiva, e não se limita a educação especial. É uma forma de você olhar para os grupos vulneráveis e entender que eles têm o direito a participação. Isso é educação inclusiva, você olha para todos os vulneráveis, e não só os estudantes com deficiência”.
O estudo traz diferentes personagens, entre educadores e especialistas, numa trajetória de fortalecimento da educação física inclusiva, que pressupôs a eliminação de barreiras e a ressignificação dos objetivos da disciplina.
Luiz cita avanços na área, principalmente após a criação da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, mas afirma que a inclusão ainda não era uma realidade na maioria das esferas educacionais.
Exemplo disso é que muito se falava em educação física adaptada, e não verdadeiramente inclusiva. O coordenador afirma que isso os desafiou a criar um estudo que trouxesse, além de referências de diversas instituições, uma nova teoria inclusiva inserida na disciplina:
“Acabamos tendo que criar uma matriz em relação às regras e aos materiais, pois não existiam dentro da discussão da educação física. Nós criamos, e isso deu inteligibilidade para as pessoas entenderem o que estávamos falando.”
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As pesquisas acadêmicas realizadas para a produção do estudo de caso apoiaram, ainda, a criação do Portas Abertas para a Inclusão, formação realizada pelo IRM, com apoio da Fundação Barcelona e parceria do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), num momento em que o Brasil estava para sediar grandes eventos esportivos, como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.
O projeto começou de forma semipresencial, tendo como principal estratégia a realização de cursos sobre educação física inclusiva para educadores, gestores escolares e membros das equipes de secretarias de educação. Seu intuito inicial era colaborar para a construção do legado social dos jogos no país e garantir melhores condições de aprendizagem aos estudantes com deficiência nas escolas regulares. Atualmente, o programa agora conta com um curso EAD autoinstrucional.
Luta a favor da inclusão
Luiz é mestre em psicologia e educação e expõe que uma formação de base que forneça uma posição crítica e gere reflexões sobre as lutas sociais é essencial para que cada vez mais haja avanços não só em discussões, mas também em prática.
Além disso, as formações continuadas, como o Portas Abertas, também auxiliam na luta de movimentos sociais: “Em todas nossas formações buscamos trazer questões sociais como reflexão. Discutimos a partir da Declaração Universal de Direitos Humanos, que é o último grande consenso que temos em 1948, e é a partir dela que fazemos a enunciação de valores. Provamos que os estudantes com deficiência têm os mesmos direitos que qualquer outro estudante”.
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Para o coordenador, uma vez que se parte da perspectiva inclusiva, é possível o entendimento de que todas as pessoas têm direito a todos os direitos sociais assegurados na Declaração e nas constituições:
Se você pensa em inclusão como a perspectiva de não deixar ninguém pra trás, isso vai favorecer qualquer tipo de reflexão que você fizer, seja dentro da arquitetura, da tecnologia da informação, na saúde, em qualquer atividade humana que for produzida. A preocupação é não deixar ninguém de fora, e garantir que todo mundo tenha direito equânime à participação.
Como construir uma sociedade inclusiva
Luiz explica que trazer essas lutas como tema de reflexão nas formações faz com que cada vez mais pessoas entendam as discussões atuais, e percebam que a desigualdade não é natural. Há todo um contexto histórico que faz com que grupos minoritários não estejam em posições de poder na sociedade:
“Falavam que mulheres não estavam preparadas para ocupar postos importantes, e agora falam que as pessoas com deficiência não estão preparadas. Mas é porque eles foram excluídos desse processo. ‘Não ter ninguém preparado’ não significa que essas pessoas não têm capacidade ou não têm força de vontade, e sim que a estrutura social está dessa forma.”
Dessa maneira, embora o movimento das pessoas com deficiência tenha dado passos cada vez mais significativos em direção à garantia de direitos, principalmente na educação, Luiz afirma que ainda há muito a fazer para realizar mudanças estruturais na sociedade.
“Minha sensação é que o mesmo desafio permanece: o do convencimento de outros segmentos da sociedade. Ainda estamos muito próximo das mesmas pessoas, é aquela coisa de só falar para os ‘convertidos’. O desafio que ainda persiste é fazer esse discurso ser um discurso para toda população, não só para pessoas da causa.”
Ele também afirma que não se pode pensar só no segmento das pessoas com deficiência: “As pessoas com deficiência estão em todos os lugares; são homens, mulheres, trans, gays, bis, podem ser indígenas… e o direito não pode ser negado a nenhum deles. Todos temos que fazer força para que essas coisas mudem. A ideia é que a gente pare de excluir essas pessoas do sistema formal de educação, tanto no nosso país como em todo o mundo.”
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